Portugal, um país residencial…!

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Crédito para habitação (imagem genérica).
Comercio 780

Hoje dedico-me a reflectir sobre os impactos, maioritariamente negativos, do programa governamental, ironicamente apelidado de “Mais habitação”, e os quais já se sentem em todo o mercado imobiliário, volvidos apenas três meses do início da sua apresentação.

Por José Jorge Paraíso *

Numa espécie de brainstorming nacional, onde o Governo da nação pretendeu lançar um conjunto de “quase” ideias, desgarradas, descaracterizadas e sem aderência à realidade da indústria e do particular sector da construção e mercado imobiliário. Com uma carga ideológica tal, que colocou em causa o conceito de propriedade privada. Verifica-se desde então, como todo o sector privado o previa, a desconfiança, a indignação e o medo e em resultado disso, os preços de arrendamento e aquisição da habitação subiram e as casas disponíveis em arrendamento diminuíram.

Todo este processo, gerido de forma pouco inteligente e até revoltante, abriu uma guerra aberta ao alojamento local, aos golden visa e, mais importante, à aquisição de imobiliário como meio de aforro das famílias e dos pequenos investidores. Uma guerra aberta a um sector tão importante para a economia do país, que a par do turismo, representam em conjunto 35% do PIB Nacional e que tanto contribuiu para o nosso crescimento mais recente e que tem mantido a nossa economia viva e tão noticiada na Europa. Não acredito que haja vontade do governo em destruir o tecido empresarial deste sector, não acredito mesmo, mas mais uma vez, onde o estado mete a mão, só estraga!!!

Este programa, para além dos efeitos nefastos à economia, cria problemas de clivagem social, de falsas verdades e ideias políticas perigosas, demagógicas e populistas, com frases que ficarão para a história, que só a inconsciência política, maldade e inexperiência, o justificam. Destaco a célebre frase“ toda a gente tem o direito a viver nas zonas mais caras de Lisboa e do país”! Na realidade, presumo este direito estar há muito consagrado no nosso país. Não é a falta de direito que nos retira a hipótese de vivermos nas zonas mais caras de Lisboa ou Porto, mas sim a falta de poder de aquisição, a falta de bons salários e prosperidade, a falta de crescimento económico, a falta de uma sólida e consistente governação, que já é crónica em Portugal..

Num país onde temos apenas 15% das famílias (repito, das famílias!) em portugal a viver com mais de 2300 euros mensais, onde se constroem cada vez menos casas, onde a indústria foi desmantelada, onde a burocracia é um escândalo, onde os processos de licenciamento se tornam infindáveis, onde a carga fiscal é obscena, é lógico, é obvio e provado na prática, que não há casas para esta pouca economia e não há economia para estas poucas casas. Estes decisores politicos, têm, de uma vez por todas, de assumir as responsabilidades pela má gestão e pagar pela sua irresponsabilidade e incompetência de há décadas, nem que seja com vergonha e humilhação pública.

Se por um lado já se verifica em 2023, a redução da actividade da construção em 6,5% face ao anterior trimestre, a maior queda desde 2014, onde se incluem nestas razões, os concursos públicos desertos, (resultado dos valores de referência irrealistas propostos pelo estado) e a redução das obras no segmento residencial como o grande responsável, por outro, um estudo do Idealista, indicava que a oferta de habitações para arrendamento diminuiu 53% no terceiro trimestre de 2022, face ao stock disponível no período homólogo. O programa “menos habitação”, fez precipitar a tempestade que se estava a desenhar.

Há vários factores a concorrem para a actual crise na habitação:

– A redução do já pequeno numero de produção de habitação nova em Portugal, agravado pelo clima politico e económico gerado. Recordo mais uma vez, que se na segunda década deste século se produziram cinco vezes menos casas que na década anterior e estamos perante uma nova redução do numero de casas produzidas na década que actualmente vivemos;

– O aumento das taxas de juro, que atacam directamente a classe média portuguesa, uma classe frágil e com rendimentos baixos e que este pequeno abanão a impossibilita de ir ao mercado e recorde-se que, o cliente Português representa mais de 90% do mercado imobiliário residencial em Portugal;

– O fim dos Golden Visa, que não sendo de muito impacto no espectro global nacional, sempre é mais uma franja de mercado que perdemos e muito sentido particularmente em Lisboa e no Porto;

– A suspensão de novas licenças de Alojamento Local, que representam 40% de todas as dormidas no país e 4% do PIB, num total de riqueza gerada de oito mil milhões de euros por ano;

A conjugação destes factores, resulta no emagrecimento da capacidade de aquisição dos portugueses, (90% do mercado de aquisição), em particular no segmento médio, combinada com a falta de confiança dos investidores pela razão destas medidas abruptas e que resulta na diminuição do investimento, favorecendo o aumento dos preços do segmento alto e a diminuição da produção de casas para classe média.

Prever o futuro, num sector tão dinâmico como o imobiliário é sempre um risco e deve ser feito cuidadosa e honestamente, com base em dados estatísticos e nas opiniões sólidas dos players mais influentes do mercado.

Foi com este objectivo, que na passada semana, o GRI Club, que teve lugar em Lisboa, e no qual participei com muita atenção, se repensou a habitação em Portugal. As conclusões são graves para o futuro do nosso país.

Em resultado de toda esta inépcia governamental e incapacidade para tratar o problema de forma séria e inteligente, resultará que a habitação em Portugal irá essencialmente desenvolver-se nas ditas cidades grandes, destinada a produtos de alto padrão, onde o valor das casas irá aumentar cada vez mais e não existirá no futuro investimento privado em habitação de classe média e média baixa. Seremos um país de absoluto fosso entre casas de ricos e pobres, de casas novas e velhas e isso irá acarretar um problema social e económico monstruoso, resultado da falta de mão de obra para fazer crescer a economia num seu todo. Sem casas não há pessoas, sem pessoas não há economia e sem economia não há felicidade!!!

Junta-se a tudo isto, um maior perigo, o perigo de o governo ter a tentação de inverter este ciclo da forma mais fácil, alinhando todo o mercado por baixo, como tem feito em tantos outros âmbitos da sociedade e da economia Nacional.

Não me preocupa um país onde os valores das casas de alto padrão atinjam os 15.000€/m2, não me preocupa um país onde o turismo cresça e se construam 75 novos hotéis ao ano, um país onde a reabilitação muda a face das cidades antigas e onde o urbanismo se desenvolve e promove o crescimento social e económico nas cidades periféricas.

O que me preocupa no nosso país são os baixos salários, os altos impostos, as regras complexas e desconexas, a falta de condições para o investimento em habitação para a classe média e média baixa e a redução abrupta e cada vez maior do stock imobiliário para arrendamento.

Se no anterior artigo publicado neste jornal abordei estratégias para um programa de governo para criar mais residências (Imagine-se!), mais habitação, sem custo para o estado e com a ajuda dos privados, no proximo artigo de opinião, irei abordar a forma como o estado poderá aumentar o stock de casas para arrendamento sem nenhum esforço, tal como o Estado tanto gosta: Sem Esforço! Irei reflectir sobre a lei que regulamenta o licenciamento dos loteamentos, em Portugal!

* Managing Director Kalam Portugal. Artigo publicado originalmente em Diário Imobiliário.

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