O que (não) se passa na Linha do Vouga?!

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Linha do Vouga (Foto divulgada no Facebook do MCLV).
Comercio 780

O Movimento Cívico pela Linha do Vouga (MCLV) está preocupado com o futuro da Linha do Vouga e tem vindo a constatar que longe vão os tempos em que a cultura ferroviária em Portugal parecia estar a mudar de paradigma.

Em consequência disso, a Linha do Vouga parecia bem encaminhada para um futuro promissor. Talvez catapultado pelo sucesso das campanhas do Comboio Histórico, que tiveram o seu início em 2017, a aposta e o investimento no turismo ferroviário pareciam tomar o rumo de transformar esta linha num autêntico museu vivo. Talvez inspirados por exemplos de sucesso estrangeiros, as entidades políticas e os gestores da CP – Comboios de Portugal rapidamente perceberam que o turismo ferroviário e o serviço diário de passageiros podiam conjugar-se na perfeição, ficando assim definido no PNI2030 que a Linha do Vouga seria modernizada em toda a sua extensão sem alteração de bitola.

Ora, sendo escasso o parque de material circulante de via estreita existente, não só nesta linha mas em todo o país, a CP rapidamente elaborou um plano para colocar em circulação praticamente tudo aquilo que ainda restasse e fosse possível de recuperar. Para o turismo, foi em 2016 que a CP começou por resgatar e recuperar o ex-Comboio Histórico da Linha do Corgo, que se encontrava “abandonado” na estação da Régua, compreendido pela locomotiva diesel Alsthom 9004, pela locomotiva a vapor Henschel & Sohn E214 e por três carruagens de madeira. Mais tarde, foi recuperada outra carruagem de madeira e uma carruagem-furgão napolitana, que se encontrava nas oficinas de Sernada do Vouga.

A CP decidiu não se ficar por aqui e no ano de 2020 iniciou o resgate das quatro carruagens napolitanas que se encontravam abandonadas na estação do Tua. Destas quatro, duas delas já se encontram operacionais na Linha do Vouga desde 2021, enquanto as outras duas continuam pelas oficinas de Contumil (uma praticamente recuperada e outra por recuperar). Além deste material, a CP transferiu para Guifões as automotoras Allan 9305 e 9310 com vista à sua recuperação, sendo que apenas esta última deu sinais de estar operacional. Certo é que chegamos a 2023 e, entre a chegada à Linha do Vouga das primeiras carruagens napolitanas e o resgate das automotoras Allan, já se passaram dois anos! Quer estas automotoras, quer as outras duas carruagens napolitanas, parecem ter caído num esquecimento tal que não nos permite sequer prever quando possam regressar aos carris. Por fim, há cerca de um ano, a CP resgatou as automotoras Nohab 9002 e 9003 que se encontravam “abandonadas” na estação da Livração e que depois de voltarem a estar operacionais, é esperado que sejam de igual modo transferidas para a Linha do Vouga, embora, até ao momento, também pouco ou nada se saiba quanto à evolução dos trabalhos.

Por fim, há que relembrar que foi há mais de dois anos que a CP resgatou a locomotiva VV 313 que se encontrava em pedestal em frente do Museu Ferroviário de Macinhata do Vouga, para recuperação estética, cujos trabalhos parecem finalizados, mas a composição também continua retida nas oficinas portuenses. Para o serviço regular de passageiros, a CP procedeu já a uma ampla revisão à maioria das automotoras UDD 9630, para que possam continuar a servir nesta linha por mais alguns anos. Concluindo, as questões que se impõem são as seguintes: Porque é que a CP abrandou o ritmo das recuperações de material para a Linha do Vouga? Porque é que algum do material que se encontra já recuperado continua retido em Contumil e Guifões? Sendo já possível, porque é que a CP não aluga ao estrangeiro mais material circulante para reforçar a frota do serviço regular? Por todos estes motivos, o que (não) se passa na Linha do Vouga?!

Infraestruturas

A discussão pública do Plano Ferroviário Nacional terminou no final de Fevereiro e desde então que o interesse pelos assuntos no que à Linha do Vouga diz respeito tem perdido bastante fulgor. Aliás, prova disso é o facto de nos últimos meses, as poucas notícias divulgadas na imprensa sobre a linha foram sobre aspetos pouco positivos, nomeadamente o suposto corte “indiscriminado” de sobreiros e um acidente numa passagem de nível entre uma automotora da série 9630 e um veículo pesado. De resto, parece pairar no ar o sentimento de que já pouca gente se lembra de que urge uma rápida modernização desta via férrea. Entre 2015 e os dias de hoje, dos cerca de 98 quilómetros que continuam em funcionamento, apenas 28 foram renovados e os 29 que perfazem o troço central continuam sem serviço de passageiros, desde 2013, devido à degradação da infraestrutura. Convém relembrar que, primeiramente, foram renovados os 15 quilómetros entre Águeda e Sernada do Vouga e mais tarde, já em 2022, os 13 quilómetros que separam Oliveira de Azeméis e Santa Maria da Feira. A renovação do troço Águeda-Sernada do Vouga implicou o corte da ligação do Museu Ferroviário de Macinhata do Vouga à rede ferroviária, um erro que até hoje nunca fora reparado. Além disso e apesar de anunciado em 2020, consta que, passados três anos, ainda se anda à procura de meios de financiamento para a concretização do projeto de renovação e ampliação deste espaço museológico. De salientar, também, que o sucesso da exploração do Comboio Histórico, levou a CP – Comboios de Portugal a repor a ligação à “redonda” de Sernada do Vouga, mas apesar do investimento feito em 2022, a mesma parece continuar inoperacional.

Ao longo destes últimos anos, outro aspeto que nos pareceu bastante positivo foi o esforço das mais diversas entidades na recuperação de vários edifícios de estação, alguns deles bastante degradados e abandonados. Tal facto é sempre de louvar, mas lamentavelmente quase nenhuma destas recuperações está a ser efetuada com o intuito de servir os passageiros desta linha… No entanto, os problemas que aqui acabamos de descrever nem são os piores. O grande problema é mesmo o atraso em todas as outras obras de renovação que já deviam estar a decorrer, ou até mesmo a terminar, nomeadamente a renovação do troço central, compreendido entre Oliveira de Azeméis e Sernada do Vouga (inicialmente previsto para o 3º trimestre de 2022); a finalização da renovação do troço norte entre Santa Maria da Feira e Espinho (inicialmente previsto para o 4º trimestre de 2022) e, por fim, a finalização da renovação do troço sul entre Águeda e Aveiro (inicialmente previsto para o 1º trimestre de 2023). A acrescentar a estas renovações de via, há que considerar os trabalhos para a automatização de 34 PN’s nos troços norte e sul, cujo arranque estava previsto para o início de 2023 e ainda das PN’s do troço central, a concretizar em 2024. Podemos concluir assim que, no que às infraestruturas da Linha do Vouga diz respeito, a palavra de ordem neste momento é apenas uma: “ATRASO”!

Infelizmente não são apenas os atrasos provocados por sucessivas greves e avarias que prejudicam a competitividade deste meio de transporte. Os atrasos na recuperação da infraestrutura estão a hipotecar o interesse na utilização desta linha. O verdadeiro e único prejudicado tem nome e chama-se “passageiro”! Apesar da Infraestruturas de Portugal ter informado o MCLV de que os trabalhos de renovação do troço central teriam início no 2º trimestre de 2023, estamos já pouco crentes que consiga cumprir com tal previsão, pois estamos já no mês de Junho e, daquilo que sabemos, ainda não há máquinas no terreno. Posto isto, as questões que se colocam são as seguintes: Porque é que tarda a reposição da ligação do Museu Ferroviário de Macinhata do Vouga à rede ferroviária? Porque que é que a redonda de Sernada do Vouga continua inoperacional apesar de reposta a sua ligação à rede? Porque é que quase nenhuma das recuperações de edifícios de estação acautela um espaço destinado a servir os passageiros? Qual ou quais os motivos tem a IP a apresentar para justificar os atrasos nas diversas renovações de via da Linha do Vouga? Quando começam, afinal, os trabalhos de renovação do troço central? Por estes e outros motivos, o que (não) se passa na Linha do Vouga?!

MCLV

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