O Oceano, fonte de vida, está doente!

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Recursos marítimos.

De tanto que já se fala sobre o assunto, parece que se torna aceitável que assim seja. A poluição marinha, a degradação dos ecossistemas, o esgotamento dos stocks de pescado e a acidificação da água do mar, são os principais problemas identificados e que têm consequências inimagináveis para o planeta e para a humanidade.

Por Rute Candeias *

Talvez, por o problema ser tão grande como o próprio oceano, mas, ao mesmo tempo, um pouco invisível para os menos atentos, haja um sentimento generalizado de impotência e apatia que nos assombra e que nos faz “assobiar” para o lado. Talvez queiramos acreditar que o problema se resolve por si próprio, que não é assim tão grave ou que alguém tratará do assunto. Na verdade, continuamos a usufruir de lindas praias, a deliciar-nos com umas belas sardinhas assadas e até nos apraz águas mais quentes para mergulharmos nos destinos paradisíacos, por isso, aparentemente está tudo bem. Ou será que não?

Os recifes de coral estão em perigo. Acima dos 29°C da água do mar, os pólipos não resistem, porque a simbiose que sustenta a sua vida, deixa de ser possível. Resta a sua carcaça, a estrutura calcária, branca e estéril, inanimada, dá-se o “bleaching”. Perde-se igualmente a infinidade de vida que aqui encontrava alimento e abrigo, e também a beleza colorida e até a economia associada ao turismo subaquático. Uma consequência direta do aquecimento da água do mar, associada ao aquecimento global, motivado pelas emissões de CO2 das nossas fábricas, dos nossos transportes e da produção de energia da qual somos reféns.

Aquele camarão delicioso que compramos no supermercado e que nem nos preocupamos a ler o rótulo, foi capturado por pesca de arrasto. A pesca de arrasto, em uma única pescaria destrói o equivalente a 5.000 campos de futebol, levando consigo corais, recifes rochosos e todos os organismos que lá vivem. O mais absurdo é que, apenas, se aproveitam 30% das espécies capturadas e o rejeitado, acaba por morrer sem ser comercializado ou consumido. Será que se esta situação fosse mais visível, continuaríamos a ignorar o que se passa, ou ficaríamos indignados e tentaríamos uma solução para acabar com este flagelo?

Infelizmente a situação é grave e, ano após ano, assistimos ao repetir dos mesmos comportamentos que estão na origem de um oceano doente. É por isso que acreditamos na Educação Ambiental e na importância da Literacia Marinha para construirmos uma sociedade mais consciente e civilizada perante as diferentes pressões que se fazem sentir sobre o Oceano.

Há poucas semanas organizámos, na ASPEA, algumas limpezas de praia na zona costeira da grande Lisboa, em que participaram alunos do 1° ciclo. Em cerca de hora e meia, para além de “lixo” variado, a maioria de plástico e relacionado com a atividade pesqueira, recolhemos e contámos 760 betas de cigarro, a maioria enterradas na areia e algumas à beira mar.

O sentimento, no final desta atividade de Educação Ambiental, era misto; por um lado tínhamos feito um bom trabalho, por outro era evidente a sensação de impotência perante tamanho problema, uma gota no oceano.

Passados 4 dias, com um fim-de-semana solarengo pelo meio, voltámos ao mesmo local, o qual tínhamos deixado limpo de qualquer vestígio humano, e surpreendentemente recolhemos mais 620 betas de cigarro. Não queríamos acreditar. É caso para nos questionarmos, o que fazer para alterar este comportamento? Já foram promulgadas leis, e respetivas coimas, mas a situação permanece. Haverá fiscalização ou vamos continuar a “assobiar” para o lado? Certamente que os alunos que participaram nesta iniciativa, jamais esquecerão este episódio e queremos acreditar que serão agentes de mudança para o futuro, mas o tempo urge.

Muitas perguntas continuam sem resposta. Até quando? É sabido de que quando o Oceano começou a dar sinais do seu desequilíbrio, há muito que o problema se tinha instalado. Teremos que ser céleres nas decisões e bem conscientes da sua importância.

A Conferência dos Oceanos, organizada pela ONU com o apoio de Portugal e do Quénia, sob o tema “Salvar os Oceanos, Proteger o Futuro”, decorreu em Lisboa entre 27 de junho e 1 de julho. Teria sido uma excelente oportunidade para dar voz às ONGs, investigadores, ativistas e educadores e envolver os decisores na procura de respostas e de soluções efetivas.

Todos podemos fazer algo, todos os dias, e ainda vamos a tempo: evitar consumir pescado proveniente de pesca de arrasto; contribuir para as políticas de Educação Ambiental na separação e recolha seletiva dos resíduos sólidos urbanos, adotar soluções energéticas provenientes de energias renováveis; fiscalizar e abolir o uso de plástico descartável são algumas das soluções que poderá adotar, enquanto cidadão, empresário ou decisor político, no seu dia-a-dia e que farão diferença na saúde do oceano.

Fomos grandes e pioneiros a atravessar o oceano, agora temos um desafio igualmente grande pela frente, protegê-lo, e para isso precisamos de todos a bordo.

* Bióloga Marinha e Educadora Ambiental. Coordenadora do Programa EducOceano da Associação Portuguesa de Educação Ambiental (ASPEA). Artigo publicado originalmente no site Essência do Ambiente.

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