Erradicação da pobreza: Esperança e preocupação

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Solidariedade (imagem genérica).
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Este ano assinalamos, mais uma vez, a 17 de outubro, o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza com um misto de esperança e preocupação. Olhamos com preocupação para o contexto atual onde a redução dos rendimentos do trabalho ao dispor dos portugueses e o aumento dos impostos contribuem para o agravamento das situações de pobreza e exclusão social. Por muito que os números oficiais nos digam que a taxa de risco de pobreza não aumentou sabemos que a situação nacional não é otimista.

Por Padre Jardim Moreira *

Medidas como o aumento do salário mínimo nacional, apesar de relevantes, não permite fazer face às despesas mais básicas das famílias, contribuindo assim para o agravamento do número de trabalhadores pobres que existe em Portugal. Estamos inquietos perante a subida constante do preço da habitação, a sua escassez, o crescimento da emigração jovem qualificada; a baixa taxa de natalidade e o índice de envelhecimento da população portuguesa.

O setor da saúde continua a revelar grandes fragilidades, como as dificuldades em aceder aos cuidados de saúde primários por uma franja significativa da população, com as listas de espera em consultas de especialidade e o descontentamento geral. A educação enfrenta, igualmente, sérias dificuldades que atingem os vários grupos da comunidade escolar, como os profissionais, os alunos e as próprias famílias. A EAPN Portugal olha com séria preocupação para a atual situação e questiona a própria forma como se olha para a educação, que cada vez mais se confunde apenas e só com a escola e/ou a formação. A educação é transversal a todas as dimensões da vida humana e deve ser encarada de forma integrada, ou seja, em complementaridade com outras áreas da vida das pessoas.

Olhamos igualmente com muita apreensão para a situação de imigrantes que se encontram em Portugal a trabalhar sem acesso a bens e serviços básicos, como por exemplo, habitação e trabalho digno. A situação de determinados grupos populacionais é preocupante já há alguns anos, como é o caso das comunidades ciganas que vivem muitas delas em habitações sem condições mínimas (barracas), não permitindo o acesso a um emprego ou à escolarização. Preocupa-nos ainda o processo de transferência de competências sociais para as autarquias locais: de que forma está a ser realizada e como se está a conseguir garantir o acesso a esses serviços por parte da população mais carenciada.

A pobreza e a exclusão social são uma negação dos direitos humanos, como o Parlamento expressamente reconheceu em 2008. Assim, é urgente aproveitar a oportunidade que Portugal tem neste momento com a aprovação da Estratégia Nacional de Combate à Pobreza e com todos os financiamentos que se encontram disponíveis por via do Plano de Recuperação e Resiliência e do Portugal 2030. Temos vários desafios pela frente e temos de agir de forma concertada e integrada. O combate à pobreza enquanto desígnio nacional não pode ser uma mera retórica. Tem de se consubstanciar em ações concretas e não em medidas avulsas e temporárias que apenas aliviam as situações de pobreza, mas não as eliminam.

A aposta deve ser numa intervenção integrada capaz de suprir as necessidades dos mais vulneráveis nas diversas esferas. É preciso uma nova abordagem de intervenção: a lógica de atuação por áreas acaba por ter poucos resultados a longo prazo e conduz a um desperdício de recursos. Importa, sim, defender o ser humano na sua integralidade – como unidade antropológica biopsicossocial – para que todas as pessoas possam ter uma vida plena. Todas as áreas se tocam e são interdependentes. O Ser Humano não pode ser pensado apenas em função das suas necessidades de ter um teto sobre a sua cabeça e de alimentos para sobreviver. Tem de ter acesso a cuidados de saúde, acesso à educação, à cultura, à inclusão social… pois o Ser Humano vive em família e em comunidade e floresce nessa interação.

Precisamos de um Estado social mais robustecido, uma aposta em políticas sociais que impeçam o agravamento das condições de vida das famílias. Falamos concretamente de melhorar os rendimentos disponíveis das famílias, de modo a fazer face à subida da inflação, de melhorar o acesso aos serviços de saúde e de educação, de investir no sector da habitação pela via da construção de mais habitação social ou a custos controlados, mas também pelo controlo do preço das rendas e das subidas das taxas de juro do crédito à habitação. São muitas as mudanças necessárias para que possamos enfrentar este contexto internacional de múltiplas Essas mudanças exigem competência, compromisso e cooperação. Há standards mínimos de que não devemos abdicar e a proteção dos Direitos sociais é fundamental. Uma sociedade que não consegue proteger os mais vulneráveis, que ignora o sofrimento e as circunstâncias de vida de muitos cidadãos com diferentes histórias de vida, é uma sociedade que não está apta a integrar, a partilhar, a crescer e amar.

Todos os seres humanos são pessoas completas ao longo do ciclo de vida e assim devem ser tratados. Não são só números e por isso não devem ser reduzidos a estatísticas, mas sobretudo devem ser considerados na sua dignidade intrínseca e individual. A mensagem que queremos hoje transmitir reflete várias vozes e várias preocupações, mas tem uma mais-valia inigualável: reflete a voz de quem vivencia situações de pobreza e que exige ação através de mudanças concretas!

* Presidente da EAPN Portugal – Rede Europeia Antipobreza Portugal.

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