Complementaridade entre a Saúde e a Ação Social

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IPSS.

As IPSS querem, desejam, a complementaridade entre a Saúde e a Ação Social, para irem além do modelo redutor de serem olhadas como um conjunto de camas disponíveis, em “alojamento coletivo”, para o alívio dos hospitais ou para pouparem dinheiro ao Estado pelos chamados “internamentos sociais”. Sabemos bem que existe uma enorme diferença entre viver em coletividade ou viver coletivamente, e que os chamados “internamentos indevidos”, carecem de uma multiplicidade de respostas na comunidade, ainda hoje muito insuficientes.

Por Maria João Quintela *

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Organizado pela Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade – CNIS, realizou-se o Seminário: “Complementaridade entre as áreas da Saúde e Ação social nas respostas sociais de acolhimento”. O Programa era dirigido às IPSS, sobretudo para ouvir as suas boas práticas, e os seus apelos relativamente às necessidades institucionais para a qualidade dos cuidados que prestam.

Ouvindo as IPSS, as suas dificuldades e as estratégias que desenvolvem, com este Seminário, a CNIS pretendeu contribuir para agilizar e promover a operacionalização da complementaridade entre a Saúde e a Segurança Social, promover cuidados que respeitem a individualidade e se processem de forma articulada, integrada e com ganhos de saúde e qualidade de vida e chamar a atenção para a necessidade urgente de um novo olhar para o trabalho das IPSS, no sentido da valorização real do que fazem, tendo em conta nomeadamente as populações de todas as idades que apoiam, e que são as mais frágeis, as mais carenciadas e com menores recursos financeiros, as mais sós, mais idosas e com maiores dependências de ajuda de outrem.

Sabemos que essa complementaridade entre as duas áreas não acontece uniformemente nas regiões e no país, e que é urgente a dignificação do trabalho solidário. As pessoas que apoiamos não são apenas portadoras de um conjunto de comorbilidades e as Instituições de Solidariedade Social, não querem ser vistas apenas como entidades libertadoras das chamadas “camas sociais” dos hospitais. Pretendem ser ativas e participativas numa mudança de paradigma dos cuidados, sabendo que as necessidades das populações evoluem e que a cada vez maior competência técnica dos trabalhadores e dirigentes das IPSS não aceitam, há muito, reduzir as respostas a “cama, mesa e roupa lavada”.

Importa mesmo reforçar que as IPSS não se satisfazem em ser consideradas como detentoras de “vagas” ou “camas”, sabendo que em cada pessoa que apoiam ou acolhem, há um conjunto cada vez maior de necessidades a satisfazer, numa perspetiva preventiva, primária, secundária e terciária, e reabilitadora, de saúde de acompanhamento e cuidados de longa duração, ao encontro de uma atuação humanista, de compaixão e competência profissional, cada vez mais específica e exigente, considerando a fragilidade cada vez maior da população que apoiam e cuidam.

As IPSS querem, desejam, a complementaridade entre a Saúde e a Ação Social, para irem além do modelo redutor de serem olhadas como um conjunto de camas disponíveis, em “alojamento coletivo”, para o alívio dos hospitais ou para pouparem dinheiro ao Estado pelos chamados “internamentos sociais”. Sabemos bem que existe uma enorme diferença entre viver em coletividade ou viver coletivamente, e que os chamados “internamentos indevidos”, carecem de uma multiplicidade de respostas na comunidade, ainda hoje muito insuficientes.

São os mais velhos, doentes e dependentes que têm que se adaptar ao Sistema de Saúde, ou o Sistema de Saúde que deve adaptar-se a uma realidade de mais de 20% da população portuguesa com 65 ou mais anos?

Porque as IPSS integram o Sistema de Saúde, e as populações que cuidam não são apenas recetoras passivas de cuidados pelo Serviço Nacional de Saúde, e que têm de se deslocar até ele. São pessoas, com direitos, aliás consignados na Constituição Portuguesa e na Carta dos Direitos Humanos, e têm uma palavra a dizer.

No Estudo “Diagnóstico de Saúde da população servida pelas IPSS associadas da CNIS”, relativamente às respostas sociais dirigidas às pessoas idosas, constatou-se que as fontes de rendimento destas pessoas são, maioritariamente, a pensão de velhice e a pensão de invalidez e, mais de metade, tem apoio financeiro inferior ao salário mínimo. A população em Estabelecimento Residencial para Pessoas Idosas, ERPI, é maioritariamente do sexo feminino e os principais motivos de internamento nesta resposta são problemas de saúde, motivos familiares, problemas financeiros e medo ou solidão.

A maioria das pessoas tem uma ou mais doenças crónicas. De entre estas, chamo a atenção para o facto de mais de metade sofrer de incontinência. As pessoas nestas circunstâncias, requerem uma intervenção multidisciplinar e integrada, prevenindo infeções urinárias e o aparecimento de escaras, e necessitam de todo um conjunto de meios e recursos humanos que não se coadunam com a simples colocação de “fraldas”, termo aliás, que deveria ser substituído por um conjunto de intervenções e meios para a prevenção e controlo da incontinência, dando às IPSS o devido apoio para os cuidados adequados a estas situações.

Grande parte da população em ERPI, tem dificuldades de memória, de comunicação, de audição e visuais, e necessita de ajuda para as atividades da vida diária. É incapaz de se vestir ou tomar banho sozinha, precisa de apoio para ter um aspeto cuidado, que favoreça a sua autoestima, precisa de ajuda para comer, tomar medicamentos, utilizar a casa-de-banho e deslocar-se da cama para a cadeira e da cadeira para a cama.

Lembro aqui o artigo 3.º da Lei n.º 46/2006, na redação conferida pela Lei n.º 75/2021, de 18 de novembro), que define pessoas com risco agravado de saúde, e cito, aquelas que «sofrem de toda e qualquer patologia que determine uma alteração orgânica ou funcional, de longa duração, evolutiva, potencialmente incapacitante e que altere a qualidade de vida do portador a nível físico, mental, emocional, social e económico e seja causa potencial de invalidez precoce ou de significativa redução de esperança de vida». Esta é a população que as IPSS cuidam e apoiam e para quem é urgente um outro olhar da Saúde e da Segurança Social.

* Membro da Direção da CNIS – Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade. Resumo de artigo publicado originalmente em Solidariedade.pt.

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