A propósito do Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza

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Imagem partilhada pela Rede Anti-Pobreza.
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No passado dia 17 de outubro assinalou-se, mais uma vez, o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza. Teve início em 1987, quando 100 000 franceses se juntaram na Praça dos Direitos Humanos e Liberdades, na capital de França, para inaugurarem um singelo monumento – uma pedra – em homenagem a quem sofria por ser pobre ou ter fome, como até ser vítima de diversas formas de violência e de medo. Só em 1992, a Assembleia Geral das Nações Unidas, reconheceu a importância deste dia e assumiu-o, a nível mundial, ao proclamar a Resolução 47/196, a 22 de dezembro.

Por Eugénio Fonseca *

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Para este ano, a ONU escolheu como tema «Acabar com os maus-tratos sociais e institucionais. Atuar em conjunto para sociedades justas, pacíficas e inclusivas». Penso que este tema teve como fundamental objetivo dar relevo a algumas situações que estão fora das estatísticas relativas à pobreza, e dar maior evidência a uma das faces frequentemente ocultas deste gravíssimo drama social: «os maus-tratos sociais e institucionais sofridos pelas pessoas que vivem na pobreza e pretende debater formas de agir em conjunto, no âmbito do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 16 para promover sociedades justas, pacíficas e inclusivas.»[1].

Trata-se, em suma, de não desistir de considerar que a pobreza absoluta não é uma fatalidade, mas possível de erradicar, se se conseguir atingir os objetivos da «Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável». Todavia, há que não descurar que a pobreza e a eliminação do escândalo das desigualdades sociais são duas prioridades que obrigam a determinações e responsabilidades coletivas. Estas duas prioridades têm de ser assumidas, de forma estreita e interdependente, pelos decisores políticos e pelos órgãos intermédios da sociedade civil no sentido da implementação de um novo modelo económico que coloque no seu eixo a pessoa e o respeito inviolável pela sua dignidade, assim como a preservação rigorosa do cosmos. Que seja uma economia que, como é óbvio, produza riqueza, mas que seja distribuída com equidade para que desapareçam as malévolas desigualdades sociais e seja mais justo o progresso no mundo.

Em Portugal, a pobreza teima em ser um dos seus problemas sociais mais grave e estrutural. Dos 27 países da União Europeia, o nosso país ocupa o 13.º dos mais pobres.

Veja-se o que referem os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), que fixa a linha de pobreza, como nos outros países da EU, 60% da mediana do salário mínimo auferido por adulto. Este método e o facto de não serem alvo de estatística, para este fim, as pessoas em situação de sem abrigo ou as institucionalizadas, faz com que não sejam realistas os níveis da pobreza conhecidos no nosso país. Mesmo assim, estima-se que, em 2022, 20,1% dos portugueses estavam em risco de pobreza ou de exclusão social. O desemprego era uma das maiores causas da privação de bens financeiros.

Sendo esta uma situação muito grave, não deixa de ser uma injustiça inqualificável que 10% das pessoas em situação de pobreza, trabalhem, mas os salários que têm não são suficientes para assegurarem uma subsistência favorável, sem esquecer outro drama que é a precariedade no trabalho. Esta singularidade portuguesa poderá justificar a razão que faz com que a pobreza seja persistentemente elevada. Mas, ainda há situações que precisam de maior atenção, por estarem na fase da vida mais apropriada para fazer parar a trajetória que leva à pobreza e à exclusão social; refiro-me às crianças e jovens que necessitam de ações preventivas adequadas.

As crianças são um dos grupos mais atingidos pela pobreza. Dos 20,1% da pobreza existente em Portugal, 25% são famílias monoparentais onde existe, pelo menos uma criança. Quando as famílias são compostas por dois adultos e por três ou mais crianças dependentes a taxa já é de 39,8%. Se todas as cidadãs e cidadãos que vivem nesta condição de falta de recursos para viverem com dignidade não tivessem direito a subsídios da Segurança Social, como são o subsídio de desemprego, por doença, ou invalidez, apoios à família, habitação… o nível da pobreza, em Portugal, seria dramático, pois 42,4% da sua população viveria pobre.

Transcrevo um trecho do relatório que a PRODATA publicou no dia 17 de outubro último, por me parecer bastante incisivo para quem queira ter uma ideia abrangente da pobreza no nosso país: «A pobreza no país é estrutural. Nascer pobre não deveria ser uma sentença, mas a persistência ao longo de gerações é uma das características mais determinantes da pobreza em Portugal. Para romper este ciclo, são necessárias políticas direcionadas às crianças mais desfavorecidas e às suas famílias. Mas este combate também passa pela educação que faz funcionar o elevador social e pela transformação do mercado de trabalho, aumentando a produtividade e o valor acrescentado da economia nacional.»[2].

Não se pode pedir só às IPSS ou a qualquer outra ONG que erradiquem a pobreza. Nem tão pouco isso se consegue com ações paliativas. Felizmente, que Portugal já tem um “Plano Estratégico de Combate à Pobreza”. Prevê, como sempre defendi, a intervenção de diferentes áreas governativas. É desejável, agora, que os ministros responsáveis pelos Ministérios indicados na Estratégia se reúnam com alguma regularidade, a fim de que as medidas que o justificarem, se transformem em Políticas Públicas que tenham em conta, na sua aplicação, a subsidiariedade. As IPSS, cada uma segundo as suas finalidades, criatividade, e capacidades financeiras têm dado o seu contributo para minimizar os efeitos mais perversos da pobreza. Que as Redes Locais de Freguesia e as Redes Sociais a nível concelhio sejam os espaços privilegiados para concretizar, aproveitando a eficácia e eficiência que a proximidade produz, aquilo que a Estratégia Nacional tem de maior pertinência em cada distrito. Algumas IPSS poderiam até ter a vantagem de ser desafiadas a acrescentar ou alterar as suas respostas sociais. Com as transferências sociais do Poder Central para o Local poderão as IPSS ter a oportunidade de revitalizar a sua identidade, equacionar a sua missão, fortalecendo os seus valores.

A pobreza não é uma fatalidade. Do contrário ninguém me convence.

[1] https://eurocid.mne.gov.pt/eventos/dia-internacional-para-erradicacao-da-pobreza.

[2]https://www.pordata.pt/sites/default/files/202410/pr_dia_internacional_pobreza_2024_pordata_vf.pdf

* Artigo publicado originalmente no jornal Solidariedade.pt.

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