Central da ERSUC, em Eirol, Aveiro.

Depois de uma revolução das infraestruturas de recolha, tratamento e deposição de resíduos, levada a cabo há umas décadas, e que implicou a criação de entidades diversas para a sua gestão – tanto nos sólidos urbanos, como nos não urbanos e nos perigosos – Portugal passou rapidamente a conservador, em matéria de resíduos.

Por José Manuel Palma *

Os fundos comunitários permitiram afastar da vista do comum cidadão o empecilho, esquecendo que, logo que construídas, essas infraestruturas nunca poderiam ser o Alfa e o Omega da política de resíduos. Com a entrada em cena da redução, da reciclagem, da separação de biorresíduos, da valorização orgânica ou energética, entre outros, essas infraestruturas seriam apenas a base.

Para além disso, o investimento europeu não iria passar mais pelos aterros ou mesmo pela incineração, já largamente excedentária noutras geografias mais desenvolvidas. Com o tempo a passar, fomos confrontados com planos (PERSU, PERNU, etc.) que, em cadência regular, foram (e continuam) a propor novas metas e a sublinhar o incumprimento das antigas.

Há cerca de meia dúzia de anos, numa conferência da especialidade, alertei para o esgotamento dos aterros e para a necessidade iminente de exportar resíduos- uma estratégia à italiana que traria consequências ambientais e económicas muito negativas – o que me levou muito facilmente a sentir-me o Velho do Restelo do momento.

Infelizmente, nos últimos meses o Secretário de Estado veio a terreiro confirmar que essa será provavelmente uma solução para a situação crítica que vivemos. O plano de ação (TERRA), pedido pelo governo a uma comissão de peritos, veio quantificar a situação, apontando para o esgotamento da maioria dos aterros, para a capacidade insuficiente de tratamento e para a inexequibilidade das metas, em quase todas as fileiras. Sobre as propostas do plano TERRA, impõem-se algumas notas positivas:

  • A necessidade de campanhas de sensibilização específicas e não gerais: grande parte das campanhas baseia-se na crença de que conhecimento e informação muda comportamentos. Infelizmente, o comportamento está relacionado com contextos específicos, com atitudes e hábitos, com incentivos diferentes, que não resistem a soluções simplistas e que exigem diagnósticos e intervenções adequadas ao contexto;
  • O envolvimento das comunidades: devido à oposição das populações à construção de novos aterros e infraestruturas, estes, muitas vezes indevidamente, tendem a estender-se, confirmando a justeza dessa contestação. É necessária uma visão técnica na relação com as populações que lhes dê controle e que leve as comunidades para o processo, e não apenas durante a Avaliação de Impacte Ambiental;
  • A diversidade de soluções: não existe um processo de separação único nas nossas casas, tal como não existe o “melhor” sistema de tratamento. Desde soluções locais de compostagem, até instalações de valorização energética ou reciclagem distribuídas pelo território, as soluções devem ser regionais.

O desafio para o próximo Governo passa pela implementação de uma política de resíduos que permita modelar os incentivos, promover as soluções corretas e a atividade dos diferentes agentes. É fundamental ser sempre inflexível na hierarquia de resíduos, mas sempre flexível nas soluções de separação e tratamento.

* Senior Industry Expert da S 317 Consulting e Professor da Universidade de Lisboa. Artigo publicado originalmente no site AmbienteMagazine.

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