Luís Montenegro.

A reconfiguração do elenco governativo de Luís Montenegro é um sinal de que, afinal, nem tudo estava a correr como planeado. Entre os novos rostos, destaca-se a criação do Ministério da Reforma do Estado, entregue a Gonçalo Matias, académico com conhecimento da administração pública.

Por Diogo Fernandes Sousa *

Este novo ministério deve ser mais do que simbólico e assumir um papel central na modernização do país. Há décadas que se fala em reformar o estado, mas pouco se concretizou para além de planos vagos ou medidas avulsas. Gonçalo Matias tem agora a oportunidade e a responsabilidade de desenhar uma agenda de reformas estruturais que, se bem executadas, podem tornar o estado mais ágil, transparente e próximo dos cidadãos.

Entre as prioridades, impõe-se uma revisão da administração pública, desde a simplificação de processos burocráticos à digitalização de serviços, passando pela reorganização dos quadros de pessoal e dos mecanismos de recrutamento, atualmente demasiado dependentes de redes partidárias. A transparência, a meritocracia e o rigor na gestão dos recursos humanos e financeiros devem estar no centro desta reforma.

Outro eixo crítico será a clarificação de competências entre o estado central, as autarquias e as entidades intermunicipais. Persistem redundâncias, conflitos de competências e uma ineficiência crónica na resposta a problemas básicos de mobilidade, habitação ou cuidados de saúde primários. Um estado reformado deve ser mais coordenado e menos fragmentado.

Ao mesmo tempo, precisa de repensar a cultura institucional que domina o setor público. O estado deve ser avaliado pelo seu desempenho, com objetivos definidos e métricas claras. Para isso, precisa de introduzir mecanismos de avaliação e prestação de contas em todas as áreas governativas, quebrando o ciclo da estagnação.

A criação deste novo ministério pode ainda ser uma oportunidade para avançar com reformas político-administrativas mais ambiciosas, como a introdução de um círculo de compensação eleitoral, que garantiria maior proporcionalidade e justiça na representação democrática, ou mesmo uma revisão do modelo de financiamento das autarquias, que promova maior equidade territorial.

Contudo, tudo dependerá da vontade política de enfrentar interesses instalados e de romper com a tradição das reformas tímidas. O país não precisa de mais diagnósticos. Precisa, sim, de coragem para implementar mudanças concretas que melhorem a qualidade da democracia e a eficiência do estado.

A tomada de posse marcada pode ser uma segunda oportunidade para o governo. Mas a margem de erro estreita-se. A oposição, com um Chega mais consolidado, não vai facilitar. E a sociedade civil está cada vez mais impaciente com políticas que não se traduzem em melhorias reais no quotidiano dos cidadãos.

* Escritor do Livro “Rumo da Nação: Reflexões sobre a Portugalidade”, Professor do Instituto Politécnico Jean Piaget de Vila Nova de Gaia.

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