Quem ajuda a floresta?

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Floresta (foto de arquivo).
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Fala-se muito, publicam-se leis, mas a reforma florestal não se faz só com legislação.

António Guimarães *

Mais um terrível ano de incêndios florestais, que afetou seriamente a nossa região de Aveiro, em especial os concelhos de Albergaria e Águeda. Muitos dos nossos associados viram o fogo consumir anos de trabalho, agora reduzidos a cinza.

Face a esta situação, a Associação Florestal do Baixo Vouga (AFBV) manifesta a sua indignação e mágoa por tudo o que se passa na floresta portuguesa, apesar do setor florestal ser considerados por todos um desígnio nacional.

Todos sabemos que os fogos florestais são das catástrofes mais graves em Portugal, não só pela sua elevada frequência, mas também pelo impacto e rasto de destruição na vida dos portugueses, afetando de forma permanente o Ambiente.

O presidente da Liga dos Bombeiros afirmava, em 2015, que “cerca de 75% dos incêndios florestais em Portugal são de origem criminosa e os restantes 25% são devidos a casos de negligência”. Há tempos, um jornal diário noticiava que um incendiário foi apanhado em flagrante delito. Por três vezes! Confessado o crime, alegou que, quando passava na estrada, ficava enraivecido porque os pinhais não estavam limpos. Sabem qual foi a sua condenação? Três anos de prisão com pena suspensa e uma multa adicional de 1.000 euros. A conclusão simples é que a justiça não funciona! E, quando funciona, é frouxa e pouco atuante. Por vezes, até parece que o crime compensa.

Mas a questão mais relevante depois de assistir a tantos incêndios florestais, é quem quererá viver no meio rural? Porque o meio rural e a floresta ficam atrás das fragas, nas berças. Lá longe, fora da cidade, é uma chatice. A resolução das questões do setor é complicada e, por isso, vão-se arrastando sucessivamente. Há outras prioridades e planos.

Fala-se muito, publicam-se leis, mas a reforma florestal não se faz só com legislação. Sem a participação e o envolvimento dos produtores, legítimos titulares dos prédios florestais, não há reforma possível. E a realidade é que, muitas vezes, o seu direito de propriedade é posto em causa e desrespeitado. A verdade é que a atividade florestal, tal como está regulamentada, é uma terrível dor de cabeça para os produtores e proprietários florestais.

Vejamos o exemplo da lei das limpezas florestais. Quando se perguntou ao nosso primeiro-ministro, “como é possível cortar a vegetação desses terrenos, sempre que atinge 20cm de altura, quando a mesma pode atingir esse crescimento num mês no período da Primavera/Verão?”. A resposta foi rápida: “Você não vai ao barbeiro todos os meses?”. Está tudo dito: os produtores que paguem a fatura.

Outro exemplo relaciona-se com a desvalorização dos terrenos florestais. A grande maioria dos prédios dos nossos associados já ardeu pelo menos uma vez nos últimos cinco anos, desvalorizando em muitos casos 50% do custo da terra. Em comparação, os custos das escrituras e outros impostos daí decorrentes continuam a ser, não raras as vezes, superior ao valor do próprio prédio.

Fogos sempre existiram e continuarão a existir. Mas é possível reduzir a dimensão desta tragédia. Os produtores precisam de todas as entidades ligadas ao sector, disponíveis para o trabalho no terreno, e não apenas para darem palavras de conforto e incentivo, acompanhadas por meras hipóteses de solução. Não é possível atuar em todo o território mas definam-se prioridades, caracterizem-se zonas de atuação.

Haja planeamento e programa de trabalho. Com os produtores e envolvimento do poder local, Câmaras Municipais e Juntas de Freguesia, que atuam no terreno e são próximas das comunidades, ao contrário da Administração Central, fechada em gabinetes em Lisboa, a capital distante que desconhece a realidade.

Se os produtores florestais não fazem mais pela gestão das suas propriedades é porque estão cansados, desanimados, descapitalizados, desacreditados e, sobretudo, abandonados por todos, dos políticos à sociedade civil.

O crime de fogo posto deveria ser considerado um ato de terrorismo. As consequências trazem igualmente mortes, dores e um prejuízo coletivo incalculável. A Floresta é indispensável à vida e os benefícios sociais, ambientais e económicos que proporciona são incomensuráveis e indiscutíveis.

A AFBV não se conforma. E os portugueses também não se deviam conformar.

António Augusto Fontoura de Ataíde Guimarães, presidente da AFBV.

* Presidente da Associação Florestal do Baixo Vouga ([email protected]).

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