Programa Portugal Ciclável não está a ser executado com o ritmo desejável

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Bicicletas de uso partilhado, Oliveira de Azeméis.
Comercio 780

A bicicleta não foi considerada uma prioridade no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência. Será que a Estratégia Nacional de Mobilidade Activa (ENMA) – Ciclável e Pedonal – vai continuar fora dos restantes instrumentos de financiamento, em particular do PT2030? O Programa Portugal Ciclável, previsto no âmbito do Programa Nacional de Investimentos 2030, identificava um pacote de investimentos de 300 milhões de euros que não está a ser executado com o ritmo desejável.

Por José Manuel Caetano *

As únicas fontes de financiamento que estão a contribuir para os objectivos da ENMA são o POSEUR, o Fundo Ambiental e o Fundo de Transportes, mas apenas para apoio à aquisição de bicicletas ou para apoio à instalação de estacionamentos com uma execução anual proporcionalmente baixa. Temos de ter muito mais ambição nessa execução. Precisamos de profundas transformações no desenho urbano das cidades e vilas portuguesas. Precisamos de reabilitar e construir bairros 100% sustentáveis e o PT2030 deveria estar a contribuir para essa transformação. Temos de devolver espaço público ao peão, garantir segurança rodoviária e disponibilizar serviços de bicicletas partilhadas em Portugal. O forte investimento em curso na expansão de grandes obras de metro ou ferrovia não é uma bala de prata porque a transição ecológica do território e das pessoas tem de passar também por dar uma prioridade aos restantes transportes públicos de proximidade e a um espaço público de qualidade. Ainda não temos uma Rede Nacional de Infraestruturas Cicláveis articulada com os transportes públicos, ainda não temos um pacote de estímulos à utilização da bicicleta que inclua um subsídio à deslocação em bicicleta (0,20 €/km). Ainda não temos o co-financiamento municipal de sistemas de bicicletas partilhadas em cidades com mais de 50 000 habitantes.

É positiva a intenção do Governo de investir mais no turismo do interior. Estimular o desenvolvimento económico em territórios de baixa densidade vai contribuir para contrariar o crónico problema de despovoamento das últimas décadas, que tem inúmeros problemas graves como o abandono, os incêndios ou a exclusão social. Ora, o cicloturismo pode ser uma das actividades com crescente expressão económica. Para isso, é necessário que entidades como o Turismo de Portugal, as comunidades intermunicipais, a CP – Comboios de Portugal, a IP – Infraestruturas de Portugal, o ICNF – Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas e a nova Museus e Monumentos de Portugal trabalhem em conjunto para colocarem todas as suas competências ao serviço do país e do desenvolvimento integrado. Grande parte da nossa autenticidade – o principal motivo de quem nos visita – decorre das condições únicas e irrepetíveis que temos no país.

O clima, a gastronomia, o património natural e cultural e as infraestruturas ao longo do território são determinantes para assegurar uma boa experiência para o turista que se desloca em Portugal. Por isso, é tão importante incluir a Rede Nacional de Infraestruturas Cicláveis na Trans-European Transport Network (TEN-T), assegurando a sua qualidade e o seu financiamento para o futuro, assim como é tão necessária a existência de planos plurianuais de turismo ferroviário ou de programação cultural nos museus e monumentos portugueses. Assim, para além de “sítios únicos”, continuaremos a criar “momentos únicos”. Esse será o nosso melhor cartão de visita: juntar à autenticidade a efemeridade dos eventos. Esperamos que o Ano Europeu da Bicicleta em 2024 contribua definitivamente para uma consolidada expansão da rede EuroVelo. Procurar maior independência do turismo de massas passa também por promover o ecoturismo e o cicloturismo, convidando os turistas a conhecerem o restante território, além dos principais destinos. Precisamos, por isso, de estímulos consistentes para a rede EuroVelo, para o Ecoturismo e Cicloturismo, apoiando rotas cicláveis que sejam atractivas para turistas que viajem de bicicleta e visitem locais especialmente vocacionados para o turismo na natureza e para o turismo sustentável. Este é o trabalho que ainda não está optimizado.

É também por isso que a Assembleia da República aprovou a Resolução n.º 64/2023, de 7 de Junho, que recomenda ao Governo que Portugal assine a European Cycling Declaration e que priorize a mobilidade ciclável. Temos muito trabalho pela frente e o país dispõe de instrumentos públicos como a ENMA e o Instituto de Mobilidade e dos Transportes, que deveriam estar a capacitar os municípios, estimulando a sua acção para aproveitarem o financiamento dos próximos anos para melhorar a mobilidade em bicicleta no país. Com esses instrumentos optimizados, também os municípios estarão alinhados com a Estratégia Nacional.

* Presidente da Federação Portuguesa de Cicloturismo e Utilizadores de Bicicleta e da Confederação Portuguesa das Associações de Defesa do Ambiente. Artigo publicado originalmente na revista Smart Cities.

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