Pelo Caminho do Praião: Um percurso com a ria vazia

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Pelo Caminho do Praião (Gafanha da Encarnação, Ílhavo). Fotos de Cardoso Ferreira.
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Há algumas décadas, era nesta área que se localizavam algumas das “poças de lama” mais procuradas pelos lavradores a freguesia, que usavam essa lama viscosa e negra para impermeabilizar as “canejas” de rega dos campos de milho, permitindo que a água chegasse a toda a terra e não se infiltrasse na areia do rego.

Por Cardoso Ferreira *

A convite do meu amigo Roque, vamos trilhar o Caminho do Praião, marginal ao Canal de Mira da Ria de Aveiro, na Gafanha da Encarnação, concelho de Ílhavo, com a maré vazia.

À hora mais propícia, iniciamos a caminhada perto da “fronteira” entre as Gafanha da Encarnação e do Carmo, para percorrermos todo o Caminho do Praião até próximo da Ponte da Barra, no extremo norte daquela freguesia ilhavense.

Com a maré baixa, a pouca água da ria corre lá ao longe, muito próximo do colorido casario da Costa Nova, no chamado canal do “Desertas”, aberto na década de 1910 – 1920 para resgatar esse navio que naufrago no mar ao sul da Costa Nova. Mais perto de nós, um pequeno e pouco profundo regueirão ladeia uma ilha de areia, que os populares designavam por “Morraceira” e que em tempos era muito procurada pelos mariscadores de berbigão e de navalha.

Mais próximo, junto ao caminho, bandos de aves, como gaivotas, patos e diversas outras aves de menor envergadura passeiam calmamente pelo areal, pelos lodaçais semicobertos de moliço, e por pequenos juncais em busca de alimento.

O caminho serpenteia entre a ria, a poente, e campos agrícolas, a nascente, terrenos esses atualmente incultos, mas que outrora produziam imenso milho, batata, feijão, abóbora, entre outros produtos.

De onde em onde, deparamos com barcos tradicionais (bateiras, botes e até um velho moliceiro) ancorados no leito agora seco da ria, alguns deles servindo de poleiro para a passarada.

Enquanto os olhos se deliciam com aquela paisagem lagunar e o ar da maresia enche a narinas, continuamos a caminhada em direção ao Largo da Mota. Um imponente edifício, com uma altiva e artística chaminé, prende a minha atenção.

– É a velha estufa de chicória. Era a maior fábrica de torrefação de chicória que havia em toda a região. – afiança-me o amigo Roque.

Largo da “Bruxa”, estaleiros e mariscadores

Alguns metros mais adiante, do lado oposto do caminho, encontramos as instalações e a marina da ANGE (Associação Náutica da Gafanha da Encarnação). São muitas dezenas de embarcações, como veleiros e pequenos iates, que ocupam os espaços em terra ou que se encontram atracados ao longos dos vários trapiches existentes na marina. Uma pequena baía separa a marina do Largo da “Bruxa”, largo esse que tem a mais famosa e antiga taberna da terra, a qual acabou por dar o nome de “Bruxa” ao antigo Largo da Mota. Do lado nascente fica um estaleiro especializado na construção de veleiros.

Após uma breve paragem nessa mítica taberna, passamos entre o porto de pesca artesanal, com as embarcações atracadas nos trapiches que se estendem pela baía situada a noroeste da “Bruxa”, e as casas abrigos dos pescadores.

Nesta parte do percurso ainda restam algumas “tramagueiras” com porte de pequenas árvores, apesar de terem as raízes em pleno leito da ria. A partir daqui, e até próximo da seca de bacalhau, deparamos com a zona dos viveiros de ostras, com todas as estruturas e embarcações usadas pelos mariscadores, cuja maior concentração ocorre ao endireito das traseiras da Igreja Matriz. Também aqui é abundante a variedade de aves, havendo mesmo o avistamento ocasional de espécies como flamingos e corvos marinhos.

Agricultores usavam a lama viscosa e negra

Há algumas décadas, era nesta área que se localizavam algumas das “poças de lama” mais procuradas pelos lavradores a freguesia, que usavam essa lama viscosa e negra para impermeabilizar as “canejas” de rega dos campos de milho, permitindo que a água chegasse a toda a terra e não se infiltrasse na areia do rego.

Poucas dezenas de metros mais adiante, no início da Rua Entrecampos, ficava o antigo campo da bola, espaço agora alagado pelas águas sempre que a maré enche.

São poucas centenas de metros que separam o antigo “campo da bola” das instalações do Marina Clube da Gafanha, situada do lado sul da Ponte da Barra, mesmo junto desta. Nesta parte terminal do percurso encontramos ainda extensos juncais (“praias”, como eram designados pelos habitantes locais) em pleno leito da ria.

Ao longo dos cerca de três quilómetros deste percurso, do lado da ria, existem vários bancos para os caminhantes descansarem e apreciarem a paisagem. Do lado oposto, também deparamos com vários locais de lazer (privados).

* https://www.facebook.com/manuel.cardosoferreira.5

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