“Os Últimos Terranovas Portugueses”

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“Os Últimos Terranovas Portugueses”.

A pesca do bacalhau à linha, só foi possível porque homens de aço tripularam pequenos navios de uma valentia marinheira espantosa: o dóri.

Senos da Fonseca *

Este livro (o 18º do autor), é o fruto (amadurecido) de uma vida de observação, audição e estudo. O descritivo de uma paixão que viveu com o autor desde tenra idade. É, clara e perentoriamente assumido pelo autor, uma grande História da Pesca do Bacalhau, condensada no título : “Os Últimos Terranovas portugueses”.

Através das suas 600(seiscentas) páginas, em longa investigação, são percorridos dez séculos do historial dessa grande saga que dá pelo nome de Faina Maior.

Tendo como ponto de partida, a chegada dos Norses às longínquas e desconhecidas paragens do Atlântico Norte, no Séc. X, o trabalho documenta, depois, (Séc. XV) a descoberta e o baptismo dos bancos ricos em espécies piscícolas, então vitais, e por isso procuradas em primeira mão pelos portugueses e bascos, logo seguidos pelos franceses e ingleses. Nele fixam-se esses primeiros tempos, e os métodos de pesca então usados: em bases fixas ou à deriva.

Até ao tempo em que o cabo elástico permitiu o fundeio dos navios, de então, e o aparecimento dessa minúscula mas valente embarcação – o dóri – permitindo a pesca fundeada nos bancos, como a conhecemos até ao Séc.XX.

O livro fixa a expulsão dos portugueses (Séc. XVI/XVII) dos mares da Terra – Nova, consequência das lutas franco inglesas, e à repercussão das mesmas no domínio filipino no nosso país. Voltámos àquelas paragens, nação livre, no Séc. XIX.

De novo esperançados que ali estaria forte aconchego para as nossas depauperadas finanças, exauridas por um Império em fim de exploração. E se neste novo arranque utilizámos as mais diversas embarcações, provenientes dos mais diversas origens, externas, e as utilizámos na pesca, naqueles longínquos e inquietos mares, logo criámos o “lugre” bacalhoeiro. Navio que o saber náutico dos nossos mestres, de antanho, transmitido de boca a boca, permitiu recriar.

Com que preenchemos os quatro primeiros decénios de novecentos na pesca do bacalhau. Navios finos, elegantes de linhas bem tendidas e doces, embarcações bem resistentes ao temporal, especialmente adaptadas a um tempo em que se cometia o arrojo de apenas navegar, mar adentro, unicamente de velas içadas.

Veio depois a evolução, e com ela, a justificada comparação dos erros (e algumas virtudes!) com que, com uma décalage de 20/30 anos, seguimos as experiências francesas.

A pesca do bacalhau à linha, só foi possível porque homens de aço tripularam pequenos navios de uma valentia marinheira espantosa: o dóri. Por isso lhe é dedicado um capítulo (Cap.III), estudando-o e desenhando-lhe as formas, em 2D e 3D (para memória futura).

Tempo de estudar as gentes que viveram, directa e indirectamente, esta saga brava: referindo os centros de recrutamento, as póvoas marítimas, a tipologia hierárquica das companhas e a distribuição geográfica das mesmas.

Tempo ainda, de referenciar perfis de figuras proeminentes a bordo, a travarem luta empolgante com os desafios desarcados, por vezes brutais, da natureza. E desenhar as figuras matriarcas ”mulheres viúvas de homens vivos”, da sua importância no equilíbrio socio económico daquelas famílias que, separadas, procuravam sobreviver. Num tempo em que o futuro apenas aparecia na venda de ilusões que a propaganda procurava adoçar o sofrimento e a esperança.

Nos “Últimos Terranovas Portugueses” é analisada sem peias ideológicas, desassombradamente, o que de mau teve o regime corporativo salazarista, mas e também, o que de bom foi, apesar de tudo, capaz de fazer (tendo presente o tempo e a comparação dos factos, uma vez mais, com a experiência francesa da Terra- Nova).

Dedica-se, neste trabalho, um capitulo à pesca de arrasto (Cap.V) que, até hoje, pouco ou nada teve de tratamento, no nosso país, apesar da sua enorme importância económica.
Encerra o livro com a História Trágico Marítima, onde se dá conta e relato dos mais trágicos acontecimentos que ensombraram esta aventura, portuguesa, nos mares do Norte Atlântico.

O livro inclui cerca de 500 fotos, muitas delas inéditas, que retratam, diversos e interessantes aspectos, da vida a bordo,uma longa e extensa bibliografia,e glossário adequado.

“Os Últimos Terranovas Portugueses” não seria possível sem a ajuda de Rui Bela, que formatou, alinhou, selecionou, tratou as imagens. Todo o trabalho gráfico é obra sua.

O livro conta com os ensinamentos, o tirar de dúvidas, a participação, dos “últimos capitães” dessa gloriosa faina, figuras icónicas da mesma que, ainda hoje, felizmente estão entre nós: os capitães Vitorino Ramalheira, Marques da Silva, Valdemar Aveiro, Manuel Machado, Manuel Mendes e António Silva e Arq. José Ant.Paradela.

E com muitos e diversos antigos tripulantes (contramestres, cozinheiro, primeiras linhas, salgadores, moços) figuras centrais da epopeia do bacalhau, actores maiores da mesma, que colaboraram, o nosso agradecimento.

António José Carmo, o “último riscador” de navios, em madeira, colaborou com um trabalho, de que apenas no séc. XVI havia, notas escritas.

* Autor do livro que será apresentado pelo decano dos capitães da pesca do bacalhau à linha, capitão Manuel Machado no Museu Marítimo de Ílhavo no dia 22 de Abril (feriado Municipal ) pelas 17 horas.

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