O que podemos aprender com as árvores?

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As árvores surgiram na Terra cerca de 300 milhões de anos antes dos seres humanos e muitos povos mantiveram com elas uma relação de proximidade. E nós, na atualidade? O que podemos aprender com as árvores, inspirando-nos nestes seres admiráveis para melhorar as nossas vidas?

Por Filipa Heitor  *

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O ser humano sempre teve uma relação muito próxima com as árvores. Na mitologia celta, nórdica e greco-romana, bem como nas tradições indígenas, as árvores possuíam um importante valor espiritual e um carácter sagrado.

As árvores surgiram na Terra cerca de 300 milhões de anos antes dos seres humanos, e podem viver centenas ou mesmo milhares de anos. Por este motivo, os povos indígenas consideram que as árvores possuem uma sabedoria ancestral, sendo respeitadas e honradas como mestres.

De facto, faz todo o sentido observarmos a forma como vivem outras espécies muito mais antigas do que a espécie humana e delas recolhermos inspiração para melhorarmos certos aspetos da nossa vida.

Generosidade

Ao longo da história, as árvores têm oferecido aos seres humanos uma grande diversidade de produtos, como frutos, medicamentos, madeira e outras matérias-primas, suprindo as nossas necessidades básicas de alimento, abrigo e saúde. As árvores contribuem também para o nosso bem-estar físico, mental e emocional, sendo conhecidos diversos benefícios do contacto com florestas, como o reforço do sistema imunitário, a redução do stress e a melhoria do humor e do sono.

Mas a generosidade destes seres maravilhosos não termina no suporte da vida humana. As árvores fornecem abrigo e alimento a diversas espécies de animais, fungos e até bactérias que vivem em simbiose nas suas raízes. Menos visível, mas igualmente importante, é o seu papel regulador nos ecossistemas, através da libertação de oxigénio, fixação do dióxido de carbono, regulação do clima, purificação da água, reciclagem de nutrientes e formação do solo.

As árvores convidam-nos a ser mais generosos. Vamos, então, aprender com as árvores a cuidar e apoiar os outros, a ser suporte e porto seguro e a oferecer os nossos dons, na medida do possível e independentemente do retorno.

Cooperação

A maior parte das plantas terrestres tem uma associação simbiótica com fungos que colonizam as suas raízes, formando as micorrizas. Nesta simbiose, as plantas fornecem alimento aos fungos na forma de hidratos de carbono. Em troca, os fungos ajudam as plantas a captar água e nutrientes do solo, como o fósforo e o azoto.

Para além destes benefícios na captação de água e nutrientes, as micorrizas podem ligar as raízes das árvores debaixo do solo, formando uma rede de comunicação entre árvores da mesma espécie ou de espécies diferentes. Desta forma, uma só árvore pode estar ligada a dezenas de outras árvores numa floresta! Comparando a rede de micorrizas à internet, fala-se numa “wood wide web” que permite a partilha de água, nutrientes e sinais de defesa entre as árvores de uma floresta.

A água e nutrientes circulam entre as árvores, através da rede de micorrizas, consoante as suas necessidades. As árvores mais velhas de uma floresta têm maior número de ligações com as outras, pelo que foram chamadas de “árvores mãe” (mother trees), partilhando água e nutrientes com as árvores mais jovens em seu redor. Por outro lado, quando as suas folhas são consumidas por herbívoros, as árvores podem enviar sinais químicos através da rede de microrrizas ou através do ar, que funcionam como avisos para as outras plantas produzirem químicos de defesa.

Pensa-se que estas relações de simbiose e cooperação aumentam a resiliência das florestas a condições desfavoráveis e ameaças externas, como ataques de insetos, situações de seca e tempestades.

As árvores relembram-nos que estamos todos interligados e “juntos somos mais fortes”! Perante os desafios pessoais, os problemas sociais e ambientais, as soluções devem basear-se na ajuda mútua e na cooperação, não na competição. Se os recursos forem partilhados de forma mais justa, reduzindo as desigualdades, todos beneficiamos a nível coletivo. Aquilo que oferecemos aos outros regressará a nós de diversas formas e tornará as sociedades humanas mais resilientes e capazes de superar as dificuldades.

Flexibilidade

Algumas espécies de árvores, como o salgueiro e a aveleira, possuem ramos flexíveis, que permitem suportar a força do vento e outras pressões, sem oferecer muita resistência. Em situações de pressão externa, se uma árvore tiver ramos mais rígidos, estes poderão quebrar mais facilmente.

Nas nossas relações pessoais e profissionais, poderá ser necessário mostrarmos alguma flexibilidade para chegarmos a um acordo, sob pena dessas relações sofrerem uma “quebra”, caso não estejamos dispostos a fazer qualquer cedência. As árvores convidam-nos a ser mais flexíveis e ajustar, em certa medida, os nossos comportamentos ou a nossa forma de pensar, quando sujeitos a pressões de outras pessoas ou situações.
Desapego e renovação

No outono, à medida que o período de luz se torna mais curto e as temperaturas baixam, a capacidade de as árvores realizarem a fotossíntese vai diminuindo. Algumas espécies lidam com os desafios do outono e inverno deixando cair as folhas para pouparem energia, pois as folhas já não precisarão de ser nutridas. Estas são as espécies de folha caduca, como os castanheiros, aveleiras, faias e alguns carvalhos.

Antes de deixarem cair as folhas, as árvores de folha caduca param de produzir clorofila e distribuem os restantes nutrientes das folhas para o tronco e as raízes. Na ausência da clorofila, que dava a cor verde às folhas, surgem então as várias tonalidades entre o amarelo e o laranja dos pigmentos carotenoides, as cores tão características do outono. Até ao final do inverno, as árvores reduzem a sua atividade celular e subsistem à base da energia armazenada nas raízes e no tronco. Na primavera, quando as condições voltam a ser mais favoráveis, renovam as suas folhas.

Tal como as árvores enfrentam os desafios das estações mais frias, também nós passamos por períodos mais complicados, em que precisamos de fazer escolhas e preservar a nossa energia para aquilo que é realmente importante.

As árvores ensinam-nos a desapegar e deixar ir aquilo que já não nos serve ou que implica um gasto de energia desnecessário. Elas convidam-nos a períodos de recolhimento e introspeção, para podermos depois crescer e agir no mundo com uma energia renovada.

Penso que é tempo de recuperarmos o respeito e a admiração que as culturas antigas e os povos indígenas demonstraram pelas árvores. É tempo de voltar a escutar a natureza e, tal como eles, aprender com as árvores, inspirando-nos nestes “mestres” que estão sempre disponíveis para nos ajudar.

* Licenciada em Biologia pela Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Artigo publicado originalmente no site Florestas.pt.

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