Nem o confinamento parou as aulas de ginástica do Toninho

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António Carapinheira.
Comercio 780

António Carapinheira está, literalmente, a fazer ‘mexer’ os cacienses desde 2016, com as suas sessões de treino funcional, que nem o período de isolamento social devido ao Covid-19 fez parar, graças a diretos através do Facebook da Junta de Freguesia local, já seguidos por ‘amigos’ em várias partes do mundo.

“Como ficámos confinados, fiz uma brincadeira no nosso grupo de 200 pessoas no início de março, para não estarem paradas. Depois da experiência, o presidente viu que aquilo era útil para a comunidade e foi assim que começamos”, conta o professor de Educação Física e Desporto de 54 anos residente em Cacia, Aveiro.

O que era para ser uma ou outra aula de ginástica a partir de casa, com ajuda da esposa, para os alunos habituais da Junta, acabou por alcançar “proporções completamente diferentes”, surpreendendo pela adesão de amigos que seguem na África do Sul, Toronto (Canadá), Luxemburgo ou em França, entre outros destinos geográficos.

[vídeo de aula à distância, a partir de casa]

“Com o Facebook estou a descobrir algo diferente. Não tinha pensado continuar, era uma situação provisória, mas talvez tenhamos de colocar uma câmara para nos continuarem a seguir quando voltarmos às aulas normais”, refere António Carapinheira, antigo jogador de futebol federado.

Convívio da aula de treino funcional em Cacia.

O treino funcional e balance, com as suas diferentes classes, adaptadas às especificidades de cada grupo, de todas as idades, incluindo mais idosos (a própria mãe do professor é aluna) e pessoas com limitações atingiu em fevereiro as 500 aulas.

Em 2016, o Toninho, como é conhecido pelos amigos em Cacia, tinha deixado de ser preparador físico do futebol profissional do Beira-Mar, viu-se obrigado a recorrer ao fundo de desemprego e aproveitava o tempo para começar a preparar a aventura do doutoramento. No café, uma amiga faz-lhe o desafio para ajudar a “tirar umas banhinhas”. Uns tempos depois, voltou a ser abordado e teve mesmo de planear uma aulas, que duram até hoje.

A dinamização do treino funcional ajudou Carapinheira também a redefinir a vida profissional que a paixão pelo futebol levava a arriscar em projetos que acabam “a pagar mal ou ficam a dever”. Um novo rumo para a carreira que raramente os jogadores profissionais de futebol conseguem colocar em marcha quando é hora de ‘pendurar as chuteiras’, como veio a estudar na tese de doutoramento defendida há um ano.

“A gente tem de se fazer à vida, não estou no futebol por opção, não posso estar com lirismos, como acontecia, porque o futebol é muito instável. Quero arranjar projetos que me dêem prazer. A Junta gostou disto, troquei o futebol por isto. Estou apaixonado. Ser feliz faz parte do meu projeto de vida neste momento”, afirma, sublinhando ainda a componente “social” do projeto que o torna “de enorme responsabilidade”. Segue-se o boccia e, a mais recente aposta, ‘Walking football’.

Pandemia “é um drama” para centenas de jogadores profissionais de futebol

António Carapinheira defendeu a tese de doutoramento sobre “Abandono de carreira desportiva de jogadores profissionais de futebol em Portugal”. A pesquisa levou-o a entrevistar mais de nove dezenas de jogadores portugueses internacionais, de três gerações. Uma transição que apenas a elite consegue fazer com o futuro assegurado, sendo a instabilidade financeira a regra no pós abandono.

Com exceção da liga principal, a pandemia deixou centenas de futebolistas profissionais em dificuldades, reflexo da própria instabilidade dos clubes, e o futuro muito incerto.

“É um drama, as pessoas não tem noção das dificuldades nos clubes do Campeonato de Portugal, dos distritais, os jogadores quase não recebem. Não posso ser profissional e ganhar como amador, mas é a realidade dos campeonatos. Como sobrevivem ? É um drama, têm a ilusão de ter uma carreira e estão privados de potenciar a carreira. Não é só a parte financeira, é a parte mental também, estar privado de fazer o que faz”, refere António Carapinheira.

A maioria destes jogadores não estão preparados para o abandono e parados deixa-os sem visibilidade. “Temos aqui uma oportunidade, todos, e não só no futebol, de refletir sobre isso, encontrar cada um as soluções para perceber o que temos de mudar. Não posso ser treinador se não pagam. Se não tenho competências ou não sou tão bom, vou ter de procurar fazer outras coisas, sair da zona de conforto. Mas a maioria só vive para jogar a bola e quase todos não sabem fazer mais nada. É preciso adaptarem-se a novas realidades e soluções para resolverem os seus problemas”, defende o professor doutor.

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