Metro de superfície.

Aveiro tem crescido – disso já ninguém tem dúvidas. Mas importa perceber como, porquê e com que consequências. O crescimento demográfico da cidade nos últimos anos tem-se sustentado, em grande parte, graças à imigração e à chegada de pessoas em busca de melhores oportunidades. Porém, apesar deste dinamismo, o número de eleitores em Aveiro diminuiu de 2024 para 2025, o que é um indicador claro: há mais população, sim, mas menos residentes com capacidade efetiva de decidir o rumo político do concelho. A população “real” cresce, mas a cidade está cada vez menos acessível para quem aqui quer viver, trabalhar e construir futuro.

Por Francisco Albuquerque *

Está a ler um artigo sem acesso pago. Faça um donativo para ajudar a manter o jornal online NotíciasdeAveiro.pt gratuito.

A explicação é simples e alarmante: falta de habitação e de políticas públicas eficazes nesse domínio. Com o aumento dos preços e a escassez de nova construção, Aveiro tornou-se um território proibitivo para quem tem rendimentos dentro da média nacional. Os municípios vizinhos como Ílhavo, Oliveira do Bairro ou Águeda são, hoje, beneficiários líquidos desta exclusão: recebem quem Aveiro não consegue ou não quer acomodar.

Nas últimas semanas, a mobilidade voltou ao centro do debate político local. Todos os partidos parecem concordar: pouco ou nada foi feito na última década. As prioridades, bem sabemos, tiveram de ser outras. A gestão da mobilidade tornou-se uma urgência estrutural e uma prioridade transversal a qualquer candidatura séria para as eleições autárquicas de outubro. Em 2025, quem quiser vencer, terá de apresentar soluções concretas para três áreas críticas: mobilidade, habitação e transição energética.

No imediato, há uma necessidade evidente de melhorar a gestão operacional da mobilidade: reforçar os serviços da BusWay e AveiroBus, melhorar a qualidade das estradas municipais, criar e interligar ciclovias, aplicar tolerância zero ao estacionamento ilegal e recuperar a confiança dos cidadãos nos transportes públicos que são ainda vistos como “coisa de gente pobre”. Mas para além das soluções de curto prazo, é urgente pensar estrategicamente.

A requalificação da Linha do Vouga, abandonada há décadas, é finalmente unânime entre os partidos locais. Há já ideias em circulação para alterar ligeiramente o traçado na zona de Azurva e permitir o acesso direto à área do Estádio Municipal. A cereja no topo do bolo seria transformar esta linha numa verdadeira coluna vertebral da mobilidade regional.
Com a publicação, finalmente, do Plano Ferroviário Nacional, abre-se espaço à discussão de uma expansão da Linha do Vouga até ao centro de Aveiro ou à Universidade. No entanto, alguns planos apresentados parecem ignorar opções mais lógicas, realistas e eficazes. Fala-se de prolongar o LRT para o centro urbano ou até Ílhavo, soluções que exigiriam túneis, viadutos, expropriações com custos elevadíssimos e incomportáveis.

A alternativa existe e está à vista de todos: aproveitar o canal disponível ao longo da Linha do Norte entre as Quintãs e a Estação, criando dois novos apeadeiros (São Bernardo e outro junto ao cemitério/centro de saúde), a menos de 15 minutos a pé da Universidade, Hospital e das escolas. Este percurso, ligado à Linha do Vouga, criaria um semi-círculo ferroviário – o embrião de um metro de superfície – entre o Estádio e as Quintãs. Custaria até 10 vezes menos do que as alternativas apresentadas, com impacto urbano muitíssimo mais reduzido e vantagens operacionais semelhantes e concretas.

Quanto à ligação ao centro de Ílhavo, a meu ver, pode perfeitamente ser assegurada por rodovia, uma vez construída a ligação da Rua da Pêga ao PCI. Já a ligação às praias, sim, é estratégica e há uma infraestrutura esquecida que pode ser decisiva: o Ramal do Porto de Aveiro, que custou 70 milhões de euros em 2009 e hoje continua subaproveitado.

A Infraestruturas de Portugal (IP) acabou de investir 75 milhões na modernização da Linha do Norte entre Espinho e Gaia e prepara nova empreitada entre Ovar e Espinho, melhorando a linha e eliminando passagens de nível. Onde está Aveiro neste mapa de investimentos? Quando terá o município força negocial para exigir à IP o que é justo e estratégico para a região? Aveiro precisa de deixar de ser paisagem no comboio da modernidade.

Podemos comparar tudo isto com uma terceira opção: não fazer nada. Manter tudo a definhar. Deixar que os autocarros envelheçam, que a ferrovia enferruje, que os preços das casas continuem a expulsar famílias e que o discurso político continue a remeter tudo para o “próximo ciclo”. Mas se nada se fizer, Aveiro corre o risco de deixar de ser um município atrativo, uma cidade vibrante, uma região com peso. E não há nada que diga que o dinamismo do passado é garantia para o futuro.

Se queremos, de facto, dar as boas-vindas ao futuro, então é tempo de deixar os discursos e passar às decisões.

* Gestor Industrial.

Siga o canal NotíciasdeAveiro.pt no WhatsApp.

Publicidade e serviços

» Pode ativar rapidamente campanhas promocionais no jornal online NotíciasdeAveiro.pt, assim como requisitar outros serviços. Consultar informação para incluir publicidade online.