Discriminações negativas e anacrónicas relativas ao uso da bicicleta

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A atual pandemia Covid-19 colocou-nos um conjunto de desafios, mas cumpre-nos a todos resolve-los transformando-os em oportunidades para a sociedade, utilizando novas abordagens, até porque problemas novos não se resolvem com soluções do passado.

Por Gil Nadais *

Carta Aberta

Sr. Primeiro Ministro, Dr. António Costa

Dirigimos-lhe esta missiva, numa fase tão importante da nossa vida coletiva, porque entendemos que é um momento de mudança e todos somos poucos para fazer o muito que é necessário.

A ABIMOTA, Associação Nacional da Indústria das Duas Rodas, Ferragens, Mobiliário e Afins, representa entre outros setores o das duas rodas, das bicicletas, que são altamente exportadores.

Mais de 90% da sua produção é enviada para outros países, tendo atingido no ano passado um valor superior a 400.000.000€, que emprega cerca de 9000 pessoas de forma direta e perto de 30.000 indiretamente.

Tal como em outros setores de atividade económica, temos algumas empresas Associadas que estão com dificuldades,mas não é sobre este tema que queremos falar hoje.

Embora não deixe de ser importante enfatizar que o atual clima de incerteza turva a visão de desenvolvimento que o setor tem vindo a trilhar nos últimos anos, com planos e projetos de expansão e desenvolvimento de capacidades tecnológicas e industriais que, podem estar em causa.

Portugal fornece para alguns dos países que mais utilizam a bicicleta no seu modo de vida quotidiana e estamos certos, até tendo por base as políticas Europeias de descarbonização, o Green Deal, Pacto Ecológico Europeu, que estas serão as grandes linhas que orientarão o futuro da Europa, e também do Governo a que preside tendo como objetivo um Portugal mais verde e mais sustentável.

A atual pandemia Covid-19 colocou-nos um conjunto de desafios, mas cumpre-nos a todos resolve-los transformando-os em oportunidades para a sociedade, utilizando novas abordagens, até porque problemas novos não se resolvem com soluções do passado.

Na visão emergente, a procura de soluções para os problemas de mobilidade nas cidades motivados pela utilização do carro para deslocações individuais, veio agora associar-se a necessidade de afastamento social com a consequente diminuição da capacidade dos transportes públicos.

Por estas razões a que se juntam muitas outras já conhecidas, nomeadamente o sedentarismo e a obesidade da população, a bicicleta, em geral e a elétrica em particular, vem dar uma resposta e pode contribuir de forma decisiva para alterar, positivamente, a qualidade de vida dos cidadãos, a saúde e a luta contra a pandemia que é o Covid-19.

Lembremo-nos que é a própria Organização Mundial de Saúde que recomenda a utilização da bicicleta nas deslocações para o trabalho porque promove o distanciamento social e o exercício físico.

Sr. Primeiro Ministro

Decidimos endereçar-lhe esta missiva porque consideramos existirem algumas discriminações negativas e anacrónicas relativas ao uso da bicicleta que não fazem sentido e estamos certos de não serem do seu conhecimento.

Este documento não é, nem pretende ser,um caderno reivindicativo de uma organização empresarial setorial, é mais um alerta e uma apresentação de propostas para uma luta mais eficaz contra a pandemia, correção de anacronismos e abertura de caminhos de futuro.

Não deixamos de ser uma Associação setorial, como tal não somos ingénuos e não vamos afirmar que a introdução de algumas das medidas que descrevemos abaixo não vão beneficiar o setor, porque é inegável, mas estamos certos que contribuirão também para a diminuição do desemprego, expectável redução na despesa em saúde e para que possamos sair da pandemia com valores ambientais e hábitos de vida, mais adequados aos tempos atuais.

Os utilizadores de bicicletas têm merecido menor atenção, na nossa perspetiva, pelos governos ao longo dos tempos, veja-se por exemplo, que o proprietário de uma moto pode ter benefício fiscal nas reparações que efetua, o dono da bicicleta não; se utilizar a bicicleta para fazer entregas e a utilizar como veículo de trabalho, as finanças não permitem a dedução do IVA na aquisição da
bicicleta, mas se adquirir um veículo velho e poluente pode deduzir todo o IVA; mas também na administração pública, o funcionário ou agente tem direito a despesas de deslocação quando de desloca de carro ou a pé; se for de bicicleta não.

São estas e algumas outras propostas que queremos apresentar e que tomaremos a liberdade também de enviar para os diferentes Ministérios porque a mobilidade e a sustentabilidade é transversal, tal como à sociedade, ao Governo.

Neste contexto propomos relativamente a:

•MINISTÉRIO DO AMBIENTE E DA AÇÃO CLIMÁTICA

Fundo Ambiental

» Reforço do apoio à aquisição das rúbricas destinadas à mobilidade ativa;
» Alterar a percentagem da comparticipação de 10%, para 50% nas bicicletas convencionais, mantendo o valor máximo;

•MINISTÉRIO DAS FINANÇAS e
•MINISTÉRIO DA ECONOMIA E DA TRANSIÇÃO DIGITAL

» Redução da Taxa de IVA nos termos já aprovados pela União Europeia.
» Alteração do regime de IRS nomeadamente;
» Considerar as reparações das bicicletas idênticas às dos motociclos para efeitos de dedução em IRS;
» Dedução à coleta de até 50% do valor da aquisição no máximo de 200€ com os encargos na aquisição de bicicletas convencionais ou elétricas;

EMPRESAS

» Não cobrança de taxas anti-dumping a empresas que estão em processo de reconhecimento pela EU, a exemplo do que acontece no porto de Roterdão;
» Dedução do IVA quando a bicicleta é utilizada para fins profissionais, nas bicicletas convencionais e elétricas;
» IVA das bicicletas dedutível;
» Custo com as bicicletas adquiridas pelas empresas, até 1.000€, para deslocações entre casa e trabalho, integralmente dedutível no ano da aquisição;
» Direito ao uso não tributado como remuneração em espécie;
» Possibilidade da empresa oferecera bicicleta ao trabalhador, ao fim de 4 anos, como prémio de assiduidade e permanência, sem tributação quer para o trabalhador quer para a empresa;▪Atribuir à bicicleta o estatuto de viatura;
» Possibilidade da empresa atribuir um subsídio anual de deslocação, até 300€, isento de IRS, a quem se desloque de bicicleta para o trabalho;

•MINISTÉRIO DAS INFRAESTRUTURAS E DA HABITAÇÃO

» Coordenar a planificação de uma rede de ciclovias nacional que una os concelhos do país;
»Criação de ciclovias em estradas nacionais sempre que haja intervenção no edificado, de acordo com o plano definido no ponto anterior;

•MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

» Criação de percursos formativos enquadrados no Catálogo Nacional de Qualificações;
» Reforço do Programa “O ciclismo vai à Escola”;
» Introduzir atividade física / ter disponível nos jardins de infância, bicicletas de equilíbrio (sem pedais) para iniciação ao ciclismo;
» Incentivar o desenvolvimento da competência,saber andar de bicicleta, de forma a que no final do 4.º ano de escolaridade, 98% dos alunos a possuam;

•MINISTÉRIO DO TRABALHO SOLIDARIEDADE E SEGURANÇA SOCIAL

» Criação de ações de formação especializadas para mecânicos de bicicletas convencionais e elétricas;
» Majoração dos apoios à criação do próprio emprego na área da mobilidade ativa com obrigatoriedade de formação técnica e de gestão;

•MINISTÉRIO DA MODERNIZAÇÃO DO ESTADO E DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

» Colocação de estruturas para o estacionamento de bicicletas junto a todos os serviços públicos do país;
» Criação da ajuda de custo para as deslocações em bicicleta dos funcionários públicos;

•MINISTÉRIO DA COESÃO TERRITORIAL

» Apoio financeiro à aquisição de bicicletas pelas autarquias para cedência a estudantes;
» Apoio financeiro para a construção de ciclovias locais, promovendo as ligações casa –trabalho e casa -escola;

•MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA

» Redução do limite de velocidade nos centros urbanos.

Sr. Primeiro Ministro

A ABIMOTA com a apresentação destas propostas está também a dizer que se encontra disponível para, nas áreas da suas competências, colaborar ativamente com o Governo e os organismos de Estado para apoiar a implementação de todas as medidas que contribuam para uma re -industrialização de Portugal e da Europa e simultaneamente os objetivos que contribuam para transformar Portugal num país mais sustentável, saudável e coeso.

Com os melhores cumprimentos

* Secretário Geral da ABIMOTA.

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