A diferença na indiferença

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Rotunda do 'Botafogo' - Monumento a Eça de Queiroz (Avenida Europa).
Comercio 780

O que é mais grave e denota total insensibilidade é verificar que se ostenta em grandes títulos jornalísticos a requalificação da avenida, da rua, da travessa, do pequeno troço, mas na sua grande maioria somente para somar propaganda e mais valias para o futuro, as pessoas com dificuldades de locomoção são quase sempre esquecidas.

Por Francisco Labrincha *

Ser diferente é ter uma outra visão do mundo, do país, da cidade, da freguesia é ser uma minoria na maioria silenciosa, é ver as estradas, os passeios, as bermas como montanhas que têm que ser conquistadas no dia a dia, é ter que desbravar caminhos para ter acesso facilitado a estabelecimentos comerciais e públicos, usufruir de uma vida alicerçada na diferença mas para ser vivida com respeito e dignidade.

Infelizmente Aveiro dos quais se engloba Aradas tem que percorrer um longo caminho para que as pessoas com locomoção limitada se sintam seguras ao sair de casa, as ruas, as travessas e passeios na sua grande maioria não estão adequados para esta situação específica.

O que é mais grave e denota total insensibilidade é verificar que se ostenta em grandes títulos jornalísticos a requalificação da avenida, da rua, da travessa, do pequeno troço, mas na sua grande maioria somente para somar propaganda e mais valias para o futuro, as pessoas com dificuldades de locomoção são quase sempre esquecidas.

A minoria na maioria silenciosa é uma máscara social descartável?

O olhar de quem não tem GPS, nem tejadilho, nem ar condicionado, condiciona a escolha de itinerário para chegar ao destino que é muitas vezes o centro da cidade, o centro da freguesia. A odisseia no terreno sinuoso remonta à trilogia “A volta em cadeirinha” em que o acidente paira nos rodados e em que os amortecedores se queixam ao chegar ao ponto de destino. É graças a pessoas compreensivas e generosas que a vida de um ser diferente se torna mais igual, são elas que ajudam a superar as barreiras físicas, atenuando um pouco as psicológicas.

A liderar o grupo da frente a contar de trás está aquele que acompanha o carro vassoura, a cadeira de rodas, a moto elétrica, o carrinho de bebé, as muletas, o andarilho, a bengala, utensílios utilizados por gente que sofre ao dobrar de cada esquina.

Para os amnésicos e incautos acresce a indiferença e o incumprimento de não dotar na generalidade os espaços públicos acessíveis a todos, em prejuízo dos heróis que derrubam as barreiras arquitetónicas com a sua força de vontade e resiliência, os que lutam pela diferença na igualdade.

A escassos dias de mais uma inauguração de um supermercado, poucos repararam nos passeios que foram construídos para os peões, não para as pessoas com limitações de locomoção. Entradas de passeios condizentes com a lei e depois saídas sem conformidade com a mesma.

Apesar de criar postos de trabalho, para certos políticos importa a fotografia, a inauguração, a publicidade, descartam as responsabilidades para os técnicos, visão turva, pouca responsabilidade porque não há verdadeiro empenho.

A dignidade é um valor inestimável que convém enaltecer, a indignação um direito que tem que ser preservado, ser diferente é ter direito a viver sem preconceito, é ter direito a viver.

Denunciar é contribuir para a melhoria da qualidade de vida.

A todos que vivem o dia a dia nesta condição, em especial aos amigos.

* Oficial da Marinha Mercante.

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