A defesa e a conservação da natureza em Ílhavo

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Imagem da Quercus Aveiro.

Não se compreende que se façam obras na crista das dunas com a utilização de maquinaria pesada (o que leva a uma mobilização de grande quantidade de material arenoso e a destruição completa do coberto vegetal), e se insista na sua destruição através da instalação de estabelecimentos de restauração e bebidas (eufemisticamente designados por apoios de praia) no topo das dunas.

Por Direção do Núcleo Regional da Quercus *

É com grande preocupação que a Quercus Aveiro tem observado as intervenções na orla costeira de Ílhavo no âmbito do Plano de Ordenamento da Orla Costeira (POOC) Ovar-Marinha Grande.

Lê-se no site da Câmara Municipal de Ílhavo (https://www.cm-ilhavo.pt/viver/planeamento-ordenamento-e-mobilidade/planos/programas-especiais) que “os Planos de Ordenamento da Orla Costeira (POOC) surgem como um instrumento enquadrador que as pode conduzir a uma melhoria, valorização e gestão dos recursos presentes no Litoral”, e que têm como objetivos:

– Ordenar os diferentes usos e atividades;
– Classificar as praias e regulamentar o uso balnear;
– Valorizar e qualificar as praias consideradas estratégicas por motivos ambientais e turísticos;
– Enquadrar o desenvolvimento das atividades específicas da orla costeira;
– Assegurar a defesa e conservação da natureza.

Mas o que se tem observado é que se está a apostar na “valorização e gestão dos recursos”, esquecendo por completo a defesa e conservação da natureza. E esta questão não é de somenos importância, porque não se trata apenas de preservar os ecossistemas costeiros, mas de os aproveitar como defesas naturais contra o que é já evidente aos olhos de todos: o perigo da erosão costeira, que tem vindo agravar-se e irá assumir maior relevância em consequência da subida do nível médio da água do mar e do provável aumento da frequência de fenómenos extremos. As dunas são um elemento natural de defesa contra a ação dos elementos naturais e de primordial importância na prevenção da erosão costeira, pelo que devem, e têm, de ser preservadas.

É por isso que não se compreende que se façam obras na crista das dunas com a utilização de maquinaria pesada (o que leva a uma mobilização de grande quantidade de material arenoso e a destruição completa do coberto vegetal), e se insista na sua destruição através da instalação de estabelecimentos de restauração e bebidas (eufemisticamente designados por apoios de praia) no topo das dunas.

Na praia da Barra, além de um bar já existente na duna, entendeu-se que esta, apesar do seu já mau estado, tinha capacidade para albergar mais, pelo que se deslocaram estruturas antes colocadas na área da praia, para o topo da duna. Com a deslocação dos bares para a duna pretende-se colocá-los a salvo das tempestades; mas, e as esplanadas? Justifica-se, ou como se explica, que existam esplanadas (que elevam a área total ocupada pelo bar) no topo de uma duna que importa preservar?

Uma das alterações previstas no referido POOC contemplava a deslocação do apoio de praia localizado mais a Norte. O que não estava previsto é que a sua área de implantação atingisse tal dimensão em cima de uma duna.

E como se justifica a estrutura construída junto à saída para a Rua Manuel Facica? Com aquela dimensão, naquele local, com outros dois bares nas proximidades e a Av. João Corte Real a escassos 100 metros?

Das entidades que autorizaram esta alteração, ao que tudo indica à revelia do que era esperado, espera-se um esclarecimento, mas, acima de tudo, que adotem as medidas necessárias para que o que está mal seja corrigido. Se for entendimento que nada foi mal feito, ou apenas se venha a comunicar que “não foi cometida qualquer ilegalidade”, então assume-se que as referidas entidades não estão minimamente empenhadas em preservar as dunas e em combater a erosão costeira.

O que está em causa não é o aproveitamento dos recursos naturais, mas a forma como se faz. Apesar das experiências recentes no que toca a outras formas de intervenção no combate à erosão (que falharam) e no conhecimento que se tem da importância do sistema dunar, as entidades responsáveis pela administração deste recurso, não obstante as boas intenções transcritas para o papel, parecem não atuar no terreno em consonância com aquilo que seria de esperar, optando-se, a maioria das vezes, por uma visão imediatista dos benefícios que se poderão obter e esquecendo que no futuro (não muito distante), a área costeira, e Ílhavo em particular, irá enfrentar graves problemas.

Espera-se dos autarcas e dos outros responsáveis na área uma visão de futuro, ou pelo menos alguma coerência nas suas ações.

* Núcleo Regional de Aveiro da Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza.

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