“A Cultura e o Turismo são uma história com final feliz”

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Orquestra Académica da Universidade de Lisboa.

Começo por um disclaimer: De turismo só sei aquilo que aprendi, de forma empírica, nos desafios que fui abraçando ao longo dos últimos anos. De cultura saberei algo mais, assim como da sua relação com públicos e territórios.

O grosso da minha experiência foi acumulado nos quatro anos de trabalho intenso com a Orquestra Sem Fronteiras no interior do país, assim como nos dois anos como director do programa cultural da candidatura de Aveiro a Capital Europeia da Cultura em 2027, ou na programação de ciclos de música clássica em locais menos convencionais em Lisboa, como foi o projecto A Boca do Lobo, no Lux Frágil.

Em cada um destes desafios encontrei um território específico, com o seu próprio mapa de organizações e agentes culturais, parcerias estabelecidas, sinergias locais, públicos e comunidades pré-estabelecidas. Em suma, cada local configura o seu próprio ecossistema, e com a Orquestra do Algarve estou preparado para encontrar desafios desta natureza, embora únicos no que diz respeito à especificidade do contexto algarvio.

As perguntas que mais tenho recebido são precisamente sobre a minha visão para o que pode uma orquestra regional fazer pelo seu território, sendo no caso algarvio, tão especial a relação com o turismo.

Sobre estes dois ramos, cultura e turismo, gostaria de dar eco à defesa de que ambos podem representar uma aliança fortíssima. É evidente, e abundantes dados estatísticos comprovam-no, que uma relação saudável entre turismo e cultura pode ser imensamente benéfico para qualquer ecossistema humano, na medida em que aumenta significativamente os factores de competitividade e atractividade de qualquer destino, quer seja uma cidade ou um país. A atracção de investimento e oferta de trabalho ou a captação de residentes prova-o em cidades como Glasgow ou Barcelona, ambas tidas como referências internacionais para as melhores práticas de regeneração urbana através do impulso conjunto da cultura e do turismo.

Na verdade, ambos os campos encontram já um terreno comum, naquilo que é conhecido como o turismo cultural. E esse é um dos aspectos em mais rápido crescimento a nível internacional, podendo ser observado nos casos de Marvão, no Alto Alentejo, através do Festival Internacional de Música de Marvão, ou de Óbidos, na região Oeste, através do FOLIO – Festival Literário Internacional de Óbidos.

Ambas as vilas eram, até antes da criação dos festivais (em 2014 e 2015, respectivamente), conhecidas apenas pelo seu património material. Locais de emprego sazonal e com pouca ou nenhuma caracterização a nível humano, são agora locais onde há mais população, mais emprego, mais turismo, mais investimento e mais receitas, para além de ambos se terem colocado no mapa de uma forma que outras pitorescas vilas dentro de muralhas nunca o fizeram. É claro que o fenómeno não se deve exclusivamente aos festivais, mas seria difícil imaginar estes territórios a reinventarem-se de um dia para o outro sem incentivos assim. A nível internacional, podemos comparar Marvão a Salzburgo e Óbidos a Paraty, para constatar o que acontece, a médio e longo prazo, aos territórios onde o turismo alavancou a cultura e vice-versa.

São histórias de sucesso e o Algarve tem tudo para entrar nesta lista. Para isso, as parcerias e sinergias são essenciais, sobretudo exigindo da administração pública local e nacional que sejam criadas as bases e os canais para o estabelecimento das mesmas. É absurdo que a cultura se refira a públicos, numa óptica de audiência, e o turismo se refira a visitantes, numa óptica de clientela. Existem pontos em comum entre os dois ramos, e é daí que deve nascer qualquer mediação entre a cultura e o turismo. Aspectos como autenticidade, originalidade e participação são prioridades de ambos, e a ideia de comunidade deve ser central na tentativa de evitar um turismo descaracterizado ou uma oferta cultural irrelevante.

Para isso, é importante, uma vez mais, a abordagem ecossistémica: Pensar um território com todos aqueles que o compõem, quer seja ao longo de um fim-de-semana ou durante uma vida inteira.

Pelo que diz respeito à Orquestra do Algarve, posso garantir que nos três anos e meio do meu termo como maestro titular serão feitos todos os esforços para lançar e aprofundar estas sinergias.

* Maestro e diretor artístico. Artigo publicado originalmente na edição 343 da revista Ambitur.

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