Portugal atrasa em três semanas o dia em que passa a usar o cartão de crédito ambiental

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Pegada ecológica.
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A ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentável, em parceria com a Global Footprint Network, atualiza os dados relativos à pegada ecológica de Portugal. Este ano, Portugal recuou no impacto da sua pegada ecológica, por comparação com os anos anteriores.

Por Francisco Ferreira *

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Em 2024, Portugal começa a exceder os recursos disponíveis para alimentar o nosso estilo de vida a 28 de maio, sendo que em 2023 o mesmo aconteceu a 7 de maio. Tal resulta diretamente do facto de algumas das variáveis utilizadas na contabilização dos consumos no cálculo da pega ecológica serem relativas a 2020, ano em que a pandemia de Covid-19 causou uma paragem generalizada da atividade económica a partir de março.

De uma forma mais concreta, se cada pessoa no Planeta vivesse como uma pessoa média portuguesa, a humanidade exigiria cerca de 2,9 planetas para sustentar as suas necessidades de recursos. Tal implicaria que a área produtiva disponível para regenerar recursos e absorver resíduos a nível mundial esgotar-se-ia no dia 27 de maio.

A partir daí seria necessário começar a usar recursos naturais que só deveriam ser utilizados a partir de 1 de janeiro de 2025.

Portugal é, já há muitos anos, deficitário na sua capacidade para fornecer os recursos naturais necessários às atividades desenvolvidas (produção e consumo).

Ainda assim, é de sublinhar a tendência positiva de uma pequena redução da “dívida ambiental” portuguesa. Veremos se, em próximos anos teremos capacidade de a manter e melhorar.

A origem do problema

De uma forma global o nosso modelo de produção e consumo que suporta o nosso estilo de vida é responsável por este desequilíbrio. O consumo de alimentos (30% da pegada global do país[1]) e a mobilidade (18%) encontram-se entre as atividades humanas diárias que mais contribuem para a Pegada Ecológica de Portugal e constituem assim pontos críticos para intervenções de mitigação da Pegada.

Como reduzir a dívida ambiental Portuguesa (e de todos nós)

Existem medidas e ações que podem e devem ser implementadas para começar a inverter a tendência de antecipação do dia no ano em que Portugal tem de começar a usar o cartão de crédito ambiental, entre elas:

– Apostar numa agricultura promotora da soberania alimentar (produção de alimentos de qualidade; preservação dos solos, redução da poluição e do uso de água; valorização de serviços de ecossistema) reduzindo progressivamente até à completa eliminação dos apoios a práticas agrícolas assentes num único output – produção.

– Aproveitar o potencial de redução de deslocações e viagens (em particular as feitos por avião) através do teletrabalho e da realização de eventos habitualmente presenciais, em formato virtual. Para muitas empresas, entidades, trabalhadores o as reuniões virtuais e do teletrabalho são já uma realidade, o que pode ter reflexos positivos no futuro, em termos de ganhos ambientais, sociais e económicos.

– Investir de forma decisiva na criação de infraestrutura que permita uma muito mais significativa utilização de modos suaves de transporte, em particular incentivando o uso da bicicleta e eventualmente combinados com o transporte público, no sentido de evitar a degradação da qualidade do ar nas cidades para os níveis antes da crise.

– Regulamentar para que os produtos colocados no mercado sejam sustentáveis. Por exemplo, implementar normas de durabilidade, garantias do direito a reparar e atualizar, de reutilização e reciclabilidade. Estas medidas permitirão criar novas áreas de trabalho qualificado e promover uma redução da pegada dos produtos.

E onde é que cada um de nós pode fazer a diferença?

– Reduzir a presença de proteína animal na alimentação: os dados para Portugal indicam que cada português consome cerca de três vezes a proteína animal que é preconizado na roda dos alimentos, metade dos vegetais, um quarto das leguminosas e dois terços das frutas. Aproximar a nossa dieta à roda dos alimentos reduz, de forma significativa, o impacto ambiental associado à alimentação e é mais saudável.

– Movimentarmo-nos de forma sustentável: privilegiar os transportes coletivos, andar de bicicleta, a pé, e claro, reduzir ou eliminar mesmo as viagens de avião substituindo nomeadamente as reuniões por videoconferência.

– Consumir de forma mais circular: é fundamental mudar o paradigma de “usar e deitar fora”, muito assente na reciclagem, incineração e deposição em aterro, para um paradigma de “ter menos, mas de melhor qualidade”, com um forte enfoque na redução, reutilização, troca, compra em segunda mão e reparação.

O que é a pegada ecológica

Tal como um extrato bancário dá indicação das despesas e dos rendimentos, a Pegada Ecológica avalia as necessidades humanas de recursos renováveis e serviços essenciais e compara-as com a capacidade da Terra para fornecer tais recursos e serviços (biocapacidade).

A Pegada Ecológica mede o uso de terra cultivada, florestas, pastagens e áreas de pesca para o fornecimento de recursos e absorção de resíduos (por exemplo, o dióxido de carbono proveniente da queima de combustíveis fósseis). A biocapacidade mede a quantidade de área biologicamente produtiva disponível para regenerar esses recursos e serviços.

Notas: [1] Galli, Alessandro; Pires, Sara Moreno; Iha, Katsunor;, Alves, Armando Abrunhosa; Lin, David; Mancini, Serena; e Teles, Filipe (2020): Sustainable food transition in Portugal: Assessing the Footprint of dietary choices and gaps in national and local food policies, Science of the Total Environment: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0048969720348361.

* Presidente da ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentável.

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